Entro no banco que tenho conta na zona Sul do Rio. Sentado no lobby vejo
um homem de barba teclando alguma mensagem em seu smartphone. Bonezinho, bermuda, all star.
O personagem em questão tem inúmeros serviços prestados à música
brasileira.
A faxineira passa por ele, ele a chama pelo nome. Ela responde, “oi seu
João”. Ele continua a teclar. Levava uma pasta sanfonada vermelha, que devia
trazer as contas que fora pagar no banco.
Eu tento observá-lo discretamente. Depois de tantos anos acompanhando
pessoas renomadas em diversas áreas, algumas presenças ainda despertam aquela
curiosidade de fã. E com seu João, ou melhor, João Bosco é assim. O cara
sentado na minha frente tinha composto músicas que fazem parte da trilha sonora
da minha vida.
Lembrei-me das aulas de dança de salão e da música Dois pra lá, dois pra
cá. Sempre me vem à cabeça o cinismo de bijuteria: “minha pedra é ametista,
minha cor o amarelo, mas sou sincero, necessito ir urgente ao dentista”, ou da
crônica cotidiana presente em De frente pro crime: “Tá lá o corpo estendido no
chão, em vez do rosto a foto de um gol”. Como a música e a voz do seu João
casam perfeitamente com a pena genial de Aldir Blanc.
Acho que gostaria de ver João e Aldir no banco. Não tenho ideia de como
seria o comportamento de Blanc numa agência bancária. O de João Bosco eu vi.
Conhece os funcionários pelo nome. A moça do cafezinho, as recepcionistas e as gerentes.
Ele se levanta, cumprimenta todo mundo com um sorriso inesgotável e se
encaminha para a saída. Espera abrir a primeira das duas portas automáticas.
Ao passar por uma delas, o vigia que a gente não consegue ver o rosto brinca:
"finalmente seu Mengão venceu seu João", no que o artista
responde: "pois é, e o teu Vasco"? "Venceu o Botafogo no
Sábado", responde o vigilante.
João saiu do banco e provavelmente deve estar dedilhando algo genial em
casa.
"Mas Creso, você foi abduzido pela síndrome de 'Caetano Veloso para
o carro no Leblon', o que houve"?
Não, foi isso. Não estou querendo transformar esse espaço em um culto ao
clique das celebridades. Apenas me impressionei com a simplicidade do João
Bosco no banco, parece que toda complexidade de sua alma ele emprega para
suingar o violão como poucos conseguem fazer.
Recordei-me de uma entrevista que fiz com ele nos camarotes da Marques
de Sapucaí. No comando da transmissão estava o saudoso Loureiro Neto. João
Bosco me atendeu com toda a educação, e começou a falar com o Loureiro sobre
uma edição do Papo de Botequim que ele havia ouvido. Uma edição com uma
entrevista especial com Erasmo Carlos e como o bate-papo entre Loureiro e o
Tremendão o emocionara. Um cara simples que ouvia rádio.
Se vocês soubessem quanta gente marrenta eu já tive que encarar nos
camarotes da vida.. Ainda bem que um dos grandes gênios da nossa música é
tranquilo.
Cada vez mais a vida deixa evidente que não existe fórmula de
genialidade. Cada um consegue ser gênio ao seu jeito. Eu queria apenas dizer
obrigado seu João, por ter composto O bêbado e a equilibrista,
Dois pra lá, dois pra cá e tantos outros tesouros da nosso cancioneiro.
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