Um
caminhão de mudança na porta do edifício mais emblemático do rádio carioca. É
inevitável. Vai ser concluído nesta semana o desmonte do mítico endereço da Rua
do Russel 434. O prédio era enorme para o que se transformou o Sistema Globo de
Rádio. Depois de seguidas demissões havia espaços que pareciam os de cidades
fantasma.
Para quem viveu os anos de auge e bonança financeira da empresa,
olhar as cadeiras vazias, depois as salas sem cadeira e, por fim, luzes
apagadas e as portas fechadas dava uma dor na alma.
A questão é que o velho modelo do SGR sucumbiu. E na vida quando
o naufrágio se aproxima, há dois caminhos: corta-se para tirar o peso e tentar adiar
a derrota, ou investe-se tudo no que resta de força nos motores, para que o
navio consiga chegar a algum porto.
A direção do SGR decidiu cortar em vez de investir. O tempo dirá
se o pragmatismo dos números funcionou. A verdade é que na batalha da
afetividade, as emissoras perderam. Globo e CBN estavam impregnadas na alma da
cidade. Tupi e Bandnews ocuparam essas posições. A Globo, que tentou um
segmento mais qualificado, até agora vê a JB, em termos de relevância,
audiência e receita, a uma distância como do homem à lua.
Diz-se que uma das estratégias para a mudança da capital do Rio
para Brasília estava no encastelamento dos poderosos. Era uma maneira de evitar
as pressões populares. A verdade é que Brasília cresceu e, hoje, as
manifestações chegam bem perto dos palácios. A mesma estratégia teria sido
usada na Ilha do Fundão. O objetivo é que os perigosos estudantes ficassem
dispersos num campus inóspito da UFRJ. Coisas de século XX. O smartphone acabou
com os empecilhos espaciais que tentaram impor às manifestações.
A ida da Globo para o Projac, à guisa de representar uma
integração com a TV, tem esse efeito de afastamento do público. As catracas,
seguranças e muros de Jacarepaguá são quase intransponíveis a quem se deslocava
longas distâncias para levar um bolinho de fubá, uma carta com pedido de
emprego, ou um paninho bordado com o nome do comunicador, produtor ou repórter
preferido.
Estamos vendo o encerramento da cerimônia fúnebre da velha Rádio
Globo e do velho SGR. Começou com a destruição do painel com as fotos dos
grandes comunicadores da casa e a colocação no seu lugar de uma parede preta.
Passou pela mudança da produção da Globo para o Projac e se concluiu com um
caminhão de mudança na porta do SGR, para levar os restos mortais do que já foi
a maior rádio do Brasil e a mais importante rádio jornalística do pais.
A Rádio Globo se gourmetizou. Afastou-se do público que a fez
relevante. Primeiro, o afastamento foi no conteúdo, agora, fisicamente.
Uma das justificativas para a mudança é a integração com outros
veículos do grupo. Rádio Globo com a TV e CBN com o jornal. O irônico e
paradoxal é que ao se integrar a outras empresas do grupo, o próprio SGR se
desintegrou.
A ida da CBN para o prédio do Globo e a maioria da produção da
Globo para o Projac (OK, Estúdios Globo) parece a triste história de dois irmãos
que perderam os pais num acidente. Os dois se separam e vão pra casa de
parentes. Com o tempo perdem os laços fraternos. O núcleo familiar deles se
desfaz, até que no lugar dos retratos na parede surja uma tinta preta que apague
as lembranças.
Que a nova Rádio Jornal do Brasil AM não se esqueça de duas
lições. Para fazer jornalismo tem que ter jornalista e a empatia com o público
não é só desejável, é vital para uma emissora.
Artigo irretocável.
ResponderExcluirPreciso processar bem o meu luto. Sim estou enlutado. Guardei o que podia de áudios da Rádio da minha adolescência. O site www.showdoradio.com.br com o aplicativo Show do Rádio conseguiu proteger um pouco da história que os atuais diretores da Grupo Globo parecem não conhecerem. Resta-me chorar e viver de lembranças doces e lindas.
ResponderExcluir