Vamos
pensar que Anitta é antes de tudo um produto. Ela constrói uma marca há anos.
Quem pensava que ela seria uma “funkeira” de um sucesso solitário e carreira
meteórica, enganou-se redondamente. Nesse tempo, Anitta já cantou na abertura
dos Jogos Olímpicos, no Rock’n Rio Lisboa e participou da versão mexicana do
The Voice.
Anitta não se posicionar politicamente faz parte desta
estratégica. Pode decepcionar os fãs na comunidade LGBTQ, mas ela mira públicos
mais ecléticos. Um exemplo disso foi sua participação num dos episódios do The
Voice Brasil. A cantora interpretou um sucesso internacional, a melosa “Take
Look at Me Now”, de Phil Collins.
Na ocasião da morte de Marielle, Anitta já havia demorado a se
manifestar diante da justa comoção provocada nas redes. A exemplo do que
aconteceu agora, só falou alguma coisa depois de pressionada.
Podemos trazer para a discussão outro personagem: Roberto
Carlos. Ele também não se posiciona. Em alguns momentos dá pistas de que lado
está. No governo Sarney gravou uma inacreditável canção chamada “Verde Amarelo”
que deixaria Don e Ravel de “Eu te amo meu Brasil” com inveja.
Meus ídolos se manifestam. Chico Buarque e Caetano Veloso nunca
deixam de se posicionar. Essa é a forma de atuação deles. Na formação de suas
personalidades artísticas junto ao público, nos anos 1960, não se posicionar os
teria condenado ao limbo. No entanto, naquela época, o inimigo era bem
definido.
Hoje em dia, a identidade do inimigo depende do lado que você
está. Tudo é polarizado. A julgar pelas simulações de segundo turno, o Brasil
tem uma linha divisória. Se para a comunidade LGBTQ, Bolsonaro é um inimigo, há
quem ache que o petismo é tão ruim quanto.
Em virtude dessas pessoas, o produto chamado Anitta, assim como
o produto chamado Roberto Carlos vão evitar se pronunciar. Eles querem números
e cada vez mais fãs. Roberto. Carlos no começo dos anos 1970 começou o
movimento para deixar de ser o Rei do iê-iê-iê e se tornar o Rei da Música
Popular. Assim conseguiu vendas expressivas e se transformou no o que é hoje no
imaginário brasileiro.
O pink money (outro nome para as receitas do mercado LGBTQ) é
importante , mas para se tornar uma marca internacional e duradoura, Anitta
terá quer expandir seu público. Então, o máximo que os fãs vão conseguir
é a declaração genérica “não voto em machista e homofóbico”. Mais, ela não
dirá. Ao acabar a corrida eleitoral, ela vai querer democraticamente que
eleitores de Haddad, Bolsonaro, Ciro ou Guilherme Boulos continuem a clicar nos
seus vídeos e a comprar ingressos para seus shows.
Talvez esteja na hora de uma reflexão sobre se é possível
diferenciar a obra do artista e sua atuação enquanto integrante da sociedade.
Toda generalização é perigosa. Das diversas questões sem resposta que minha
alma carrega, essa é uma delas. Tem gente que eu admiro, que vota diferente de
mim e eu relevo. Há outros que eu não gosto e que o fato de ter um candidato
diferente do meu só reforça a antipatia.
Acho que Anitta tem direito de não se manifestar. Também acho
que ela pagará um preço por essa atitude. Todos nós pagamos algo por nossas
escolhas. Como não sou artista e nem tenho pretensões à unanimidade, me
posiciono: Bolsonaro é o fim. Homofóbico e espalhador da cultura do ódio, o
capitão representa uma ameaça séria demais à democracia. Seu vice é ainda mais
nocivo, quando tem ideias preconceituosas a respeito de negros, índios ou
mulheres, por exemplo. No entanto, se eu quiser a pena de morte para quem pensa
diferente de mim, estarei me igualando a tudo de ruim que penso de bolsonaristas
e que tais. Espero que o obscurantismo e os arroubos totalitários saiam
derrotados das urnas, pois o voto deveria ser o instrumento de decisão, não os
tanques.
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