Na história que contei ontem omiti um detalhe. Tive um
desentendimento com uma das vítimas do assalto. Pouco antes do de sermos
trancados no banheiro, ele soltou uma frase para os bandidos que na hora me
pareceu incompreensível e irresponsável: “vocês poderiam tirar uma foto com a
gente”?
Mandei-o para as partes mais recônditas da anatomia
humana. Não achava e nem acho, que seja recomendável brincar com alguém que tem
uma arma apontada para sua cara. A tecnologia dos telefones não era como as de
hoje. Tirar fotos no celular era um luxo. Se houvesse o registro, seria numa câmera
pré-histórica mesmo.
No entanto, ao ver as fotos dos policiais civis com
Rogério 157 após a prisão, vi que meu amigo estava apenas lançando uma
tendência. Vai aqui meu pedido de desculpas. Ele era uma pessoa na vanguarda
dos avanços tecnológicos.
Falando seriamente, essas selfies de policiais com o 157 mostram
exibicionismo, desrespeito, falta de postura... Está tudo errado. Numa das
imagens, o bandido está até sorrindo. O que deu na cabeça desses cidadãos que
pareciam estar numa confraternização de fim de ano, em vez de presentes numa
operação que prendeu o bandido mais procurado do Rio nos últimos tempos?
Quando Elias Maluco foi preso em 2002, ainda me lembro da
reação dos jornalistas na chefia de polícia, onde o bandido foi apresentado.
Ele tinha comandado a execução do jornalista Tim Lopes. Acho que envolvidos
pelo fato de ter sido um de nós a vítima do bandido, muitos jornalistas
hostilizavam Elias.
Fosse agora, a prisão seria registrada por selfies,
certamente. Fotos com indefectíveis cabecinhas viradas e gestos como o “V” de
vitória nas mãos. Nossa cultura exibicionista chegou às raias da loucura.
Todos foram inclementes com a modelo Nana Gouveia quando
ela tirou fotos após uma tempestade tropical nos EUA. O que fizeram os
policiais civis ontem foi muito pior. Foi um desrespeito à população. Exige-se
da polícia correção no cumprimento da lei. Fazer selfie para “tirar onda” que
prendeu o bandidão é na melhor das hipóteses frivolidade. Falta grave pela qual
devem responder em processos internos.
A prisão de Rogério 157 não foi uma ação entre amigos.
Aliás, hoje o posto de bandido mais procurado é de Rogério 157, mas já foi de
Cabelada, Denis, Escadinha, Marcinho VP, Bem-Te-Vi e Nem só para falar de
alguns. Não podemos cair na esparrela que a prisão de 157 é um marco histórico
na cidade.
Sem mudança nas políticas de segurança essas prisões nada
mais são do que toalhas para secar icebergs. Tem que ter um modelo sério, em
que traficantes são desarmados, as comunidades tenham a presença do estado com
porções de cidadania, não com a pirotecnia que aconteceu na Rocinha em
setembro.
Odeio frases do mundo corporativo, especialmente os
termos em inglês. Sinto que Machado de Assis, Eça de Queiroz e Olavo Bilac
devem se remexer em seus túmulos. Mesmo assim vou recorrer a uma das frases
corporativas que já ouvi, só que em português: Não chegaremos a lugares
diferentes tomando decisões iguais.
Quantas vezes já vimos um secretário de Segurança dando
coletiva após a prisão de um perigoso traficante? Os secretários se sucedem, os
perigosos bandidos se sucedem e o problema da violência permanece.
E talvez a selfie dos policiais com Rogério 157 possa
mostrar muito mais do que quis. Os policiais pareciam ter ganhado a guerra,
quando na verdade estavam comemorando uma vitória, que realmente nem era tão
vitória assim. Enquanto discutíamos as fotos dos policiais, um novo rei já estava
entronizado e controlando os negócios na Rocinha.
E para finalizar uma piada antiga, da época que as
máquinas tinham filme. Uma excursão de turistas estava pelas ruas de Paris.
Eles entravam e faziam a festa, tiravam fotos de absolutamente tudo, voltavam
organizadamente para o ônibus e continuavam a viagem. No Museu do Louvre todos
desceram menos um. O guia ficou preocupada o perguntou o motivo dele não ter
acompanhado o restante do grupo. O turista foi sucinto: “Acabou o filme da
minha máquina”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário