Ando criando fantasmagorias em meus pensamentos. O fenômeno pode estar
diretamente ligado às minhas recentes leituras sobre Walter Benjamin. Além destas,
ando lendo textos de Baudelaire, pensando em modernidade e no exercício de
caminhar e observar, com a pretensão de me tornar um flâneur.
Vamos deixar as observações alemãs e francesas de lado e trazer os fatos
para o calçamento tropical desta nossa cidade. Aliás, o exercício do flâneur
ficaria difícil no Rio. Um simples detalhe o impede: se você caminhar
observando os tipos, as fisionomias e as modas pode torcer o pé num buraco.
Quase me torno estatística das calçadas mal cuidadas pelo prefeito. Cheguei a
virar o pé, mas com uma insuspeita agilidade, livrei-me de contusão mais
grave.
Voltando às fantasmagorias, estava ouvindo Caetano Veloso no Spotify. Na
pós-modernidade, equipamentos de última geração nos possibilitam a volta ao
passado. Pois bem, estava ouvindo “Enquanto seu lobo não vem”, composição do
ano de 1968. Nela Caetano, Rita Lee e Gal Costa cantam que iriam passear na
Avenida Presidente Vargas enquanto seu lobo não vinha. Poderia ser uma fábula
infantil ou uma referência à Passeata dos 100 mil enquanto a repressão não
piorasse. Bem, cada um escuta a música como quiser.
No momento em que ouvia o refrão "Presidente Vargas", dei de cara com um
Volkswagen, modelo Variant, amarelo. A fantasmagoria foi ficando completa. O
carro foi produzido no Brasil entre as décadas de 1960 e 1970. O veículo que vi
devia ser do ano da música que eu ouvia.
Na sequência da minha playlist, vinha Tropicalia. A música também é de
68. Foi quando resolvi dar uma olhada no noticiário. A volta ao passado foi
ficando completa. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o comandante do
Exército, General Eduardo Vilas Boas, disse que a instituição está preocupada
com a legitimidade do próximo presidente eleito. Olhei a data da reportagem
para ver se estava na seção “Há 50 anos”. Não estava...
Fui conferir o noticiário internacional e li a manchete: Governo dos EUA
manteve reunião com opositores da Venezuela que queriam dar um golpe. Eu que
achei ao sair na portaria do meu prédio estava ganhando a rua, estava
prestes a me convencer que entrara num portal que me transportara a outra
época.
Antes que eu pudesse me desesperar, olhei para baixo e vi meu tênis, um
modelo cor laranja. Pensei que em 1968 não sairia com um calçado daquela cor.
Além do que, vi várias camisas laranja, no que parece ser a cor do momento na
Zona Sul do Rio. No meu caso, a cor do tênis não tem conotação política, já nas
camisas.... Mas isso é papo para depois.
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