quarta-feira, 8 de maio de 2019

Mostrar como é e ser como pode

Está proibido sentir medo. A ordem agora é a assertividade. Titubear em alguma situação é sinal de fraqueza. Os lados são tão claros que demorar a escolher alguma coisa é falha de caráter. Quando você quer dar uma avaliada para saber em que canoa vai embarcar, surge logo o grito: “você está relativizando”. 

Então, gostaria de deixar algumas coisas claras. A primeira, morro de medo. Tenho medo de avião, tenho medo de lugares fechados. Quando o metrô fica parado entre uma estação e outra conto até 10 para não entrar em desespero. Sinto vertigem em lugares altos. Nem os períodos em que substituí o Genilson Araujo como repórter aéreo reconfiguraram meus sentimentos. 

Choro em final de novela, ao ouvir certas musicas, ao me lembrar de alguém que não está mais por aqui e com os pequenos atos dos meus filhos. Chorava em apresentação de final de ano da creche, ao ver fotos de quando era mais novo e até do meu casamento. 

Sou um fracasso na nova temporada dos assertivos. Outro dia fui buscar minha filha na dança, liguei o pisca-alerta, e encostei rapidamente para que ela entrasse no carro. Se o resgate demorar 10 segundos, é muito. Mesmo assim, foi tempo suficiente para que um imbecil encostasse ao meu lado, me xingasse e fosse embora. Fiquei irado, pensei em bancar o machão. Depois refleti que bancar o machão dá um trabalho danado. 

Aliás, dirigir no Rio de Janeiro é um desafio. Repito o mantra “brigue as brigas que valem a pena”. Mas confesso não ser bem sucedido em algumas vezes. Fechadas são respondidas com buzinadas. Às vezes xingo dentro do carro e só quem ouve é a coitada da minha mulher. Pretendo melhorar isso para não ferir os ouvidos mais próximos. 

Algumas coisas me parecem tão óbvias que na verdade não tenho dúvida em condenar ou apoiar. O corte das verbas da educação é absurdo  e merece todo protesto que podemos fazer. O sucateamento da universidade pública é um crime contra a sociedade, não só contra quem trabalha e estuda lá, como podem pensar alguns incautos e cegos dos novos tempos. 

Em compensação, não sei se o Tite deve ou não convocar Neymar. Não tenho dúvidas de que agredir um torcedor é um absurdo sem tamanho. Mas tirar Neymar da Copa América talvez puna mais o time da CBF, do que o mimado camisa 10. Só que aí os donos do monopólio da certeza vão me chamar de relativista. 

É difícil viver nesse mundo. Mas como diriam os novos baianos “besta é tu, não viver esse mundo, besta é tu, se não há outro mundo”. E quando a situação ficar feia recorra a eles novamente e cante “Vou mostrando como sou e vou sendo como posso”.  Jogue seu corpo no mundo, sem medo de ter medo e com a certeza de que quem só tem certezas está trilhando um caminho errado na vida. 

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