terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Um ano novo com sapatos novos


Comecei a estabelecer na minha cabeça imagens instantâneas, outras em movimento. E no caos estavam sons de choro, de gargalhadas estridentes, e outras mais contidas. No vozerio se destacavam gritos, saudações e piadas. 

O fim do ano é assim, o exercício mental das retrospectivas. Uma freada de arrumação para entender o que acontecera até ali e planejar os caminhos que você vai seguir. 

Um dos meus mestres na profissão se chama Giovanni Faria. Ele é escolado no Caminho de Santiago de Compostela. Como já escrevi neste blog, ele me explicou que para fazer a caminhada você só pode levar uma bagagem que tenha no máximo 10% do seu peso. Por isso, é necessário saber exatamente o que se deve levar. 

No fim de ano é assim. Como a caminhada vai prosseguir, você tem que pensar no que vai ficar fora da mala. Às vezes são sentimentos, tipos de alimento, atitudes e, em casos extremos, pessoas. 

Li que só um quarto das pessoas que fazem promessas de ano novo conseguem cumpri-las. Isso é tema de fácil explicação. Promessas trazem embutidas perspectivas de mudança. E mudança de verdade não é para qualquer um. Manter as coisas é mais cômodo. Dói menos. Talvez o erro nesta avaliação é não entender que essa dor de não mudar só é menor a curto prazo, pois ao longo do tempo, o mal de permanecer acomodado é bem maior. 

Então, apesar de ser apenas uma convenção de calendário, um ano novo serve como oportunidade para mergulhos no escuro, ou se você preferir, para escaladas sem pico definido. 

Que na nova etapa a bagagem fique mais leve, mas não por preguiça e sim por escolha. Que ela tenha o exato tamanho para suportar as agruras  e celebrar as venturas do caminho. 

Todo fim traz um recomeço, toda morte significa renascer. Talvez a meia-noite do réveillon seja a tradução física-temporal dessa metáfora tão batida, mas necessária à vida. 

Um ano novo com sapatos novos, amizades renascidas, desamores descartados e amores reencontrados. E no peito a esperança que daqui a um ano estejamos novamente buscando um novo layout das palavras para tentar traduzir os mesmos sentimentos de esperança e renovação. 

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