Vasculhando
as redes sociais, vi pessoas fazendo comparações entre Spotlight e The Post.
Usando um termo que aprendi com a repórter Carina Bacelar, vou “depositar minha
treta” na questão.
Fui ao cinema com muita expectativa por The Post. Sai de lá emocionado.
O filme faz uma ode ao jornalismo, esse ofício que se transforma todo dia e
todo mundo acha que pode exercer pelo fato de ter um smartphone. The Post
mostra jornalistas correndo atrás de uma boa história e defendendo o inviolável
direito da livre informação.
Katharine Graham, interpretada por Meryl Streep, é uma mulher
que passa o filme precisando provar a todos, mas fundamentalmente a ela mesma,
que é capaz de gerir um jornal e ganhar espaço num universo tomado por homens.
Algumas cenas são esquemáticas, servem à narrativa de “estranha
no ninho” da dona do jornal. Como num encontro com o editor-chefe do jornal,
seu subordinado, em que ela pede desculpa por ter deixado o assunto mais
importante para depois; “Ah, pulei o lead”. Piada interna de jornalistas. Existem
também as cenas nas quais Katharine entra em reuniões com executivos e é quase
ignorada. Diretores mais antigos tentam manipulá-la. No entanto, ela vira o
jogo e é decisiva para o desenlace do filme.
Gosto muito do Tom Hanks, mas achei o Ben Bradlee dele
quase caricato. Entendi que foi uma composição, mas me incomodou, achei
superficial. O estereótipo do velho jornalista que conhece os atalhos do
poder serviu ao filme, mas não estará na galeria dos personagens inesquecíveis
do intérprete de Forrest Gump.
Timidamente, confesso preferir Spotlight. O ganhador do Oscar em
2016 é mais moldado a quem conhece a rotina de uma redação. O filme sobre a
investigação dos escândalos de pedofilia na igreja mostra os repórteres sendo
repórteres: convencendo fontes, apurando, escrevendo e levando não.
Quem escolheu fazer jornalismo, um momento, vou reformular: quem
foi escolhido pelo jornalismo sonha em se meter numa “encrenca” como as de
Spotlight e The Post . Correr atrás daquela história que pode mudar a realidade
de muitas pessoas. Cessar injustiças e colocar bandidos atrás das grades. O
filme de Tom MacCarthy mostra o trabalho dos repórteres, o de Spielberg é mais
enfático nas intrincadas negociações do “andar de cima” para que a matéria seja
publicada.
Fazendo uma linha do tempo, talvez Spotlight só tenha sido
possível pela vitória que o jornalismo teve em The Post. Katharine Graham
comprou a briga fundamental, num momento que os EUA afundavam numa onda
conservadora, com um governante trapaceiro que se arvorava como o dono da
dignidade. Ela “amadrinhou” duas grandes ocasiões da reafirmação do jornalismo.
Os Papéis do Pentágono e Watergate.
Spielberg faz um cinema mais monumental e direto. A cena em que
a redação do post sabe da decisão da Suprema Corte americana deixa
explícita esta proposta. A atriz praticamente se dirige ao público, não só aos
colegas de jornal. Além disso, Spielberg proporciona uma fala ao
personagem de Meryl Streep que serve como mantra para o jornalismo. “Não somos
perfeitos o tempo todo, mas nosso trabalho é insistir e continuar”.
The Post e Spotlight são duas declarações de amor ao jornalismo
e à liberdade de expressão. Lembra-nos que a imprensa deve atender aos
governados e não aos governantes. Reafirmam que não há perguntas inconvenientes
na busca das informações. Inconveniente é acobertar, fazer acordos espúrios e
sucumbir a um jogo de interesses.
Sempre é mais fácil “deixar como está, para ver como é que
fica”. Amigos, o jornalismo não é fácil.
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