domingo, 5 de maio de 2019

O jogo de ping -pong com meu filho

Em mais de um ano era primeira vez que me aventurava a jogar ping - pong. Perdoem-me os atletas da modalidade, mas minhas habilidades se negam a descrever o que jogo como tênis de mesa. 

Meu filho, a quem ensinei a jogar e já me superou completamente, era meu adversário. Jogamos 4 partidas em que quem chegasse a 21 pontos primeiro ganharia. Perdi as quatro. As que cheguei mais perto atingi 19 pontos. 

Preciso confessar que apesar de o oponente ser uma das três pessoas que mais amo no mundo, queria derrotá-lo, mas não cheguei nem perto. Meu saque deve atingir atualmente a espantosa velocidade de 10 km por século. Minha mobilidade está tão grande quanto a de um caminhão de 8 eixos e minhas pernas tão fortes quanto dois gravetos prestes a quebrar. 

Fui presa fácil. Meu filho é um adversário duro de derrotar. Quando ele estava aprendendo a jogar ainda dava, mas agora é uma missão impossível. Nessas circunstâncias, se conseguisse arrancar uma vitória dele seria quase um ato heroico. 

Ele começou impondo um ritmo forte, me jogando impiedosamente de um lado para o outro da mesa. Quando abriu 9 a 1 percebi em seu olhar condescendência. Ele foi vendo que se jogasse a 100% da capacidade terminaria com o jogo apenas no saque. 

Lembrei das vezes que perdi para ele com o objetivo de deixá-lo feliz e das vezes que o venci para ensinar que a vida é feita de vitórias e derrotas. Acho que as partidas de ping-pong de agora foram pedagógicas para mim também. Trocamos de posição, não há mais margem de manobra. A juventude dele passou por cima de mim num jogo físico. Ele me deu chances, foi displicente em alguns momentos, mas quando eu olhava alguma possibilidade de vencer, pedagogicamente ele me mostrava que era chegado o tempo de sua supremacia esportiva. 

Pensei num Corcel amarelo que vi rasgando o asfalto da Rua Jardim Botânico dia desses. Ele devia ser de 1971 ou 1972. Para um carro, era um ancião. No entanto, ainda era potente andava de forma audaz e rápida numa rua da Zona Sul. Talvez aproveitando um momento de descuido dos deuses que regem o tráfego na Jardim Botânico, sempre engarrafado. 

Me detive na imagem daquele carro, lindo com o design quadradão que caracterizava os veículos da época. O Corcel era  um símbolo de status nos anos 1970. Em 2019  rasgava a rua com os vidros abertos e o motor fazendo um barulho ensurdecedor. 

E pensei que o que foi garboso e eficaz em seu tempo se tornara uma peça de museu, que ao andar pela cidade querendo mostrar um imortal glamour, exibia também o quão antigo virou. 

O jogo entre mim e meu filho começou a virar. Estou longe da fase em que ele se transforma em meu pai, mas já estamos em lados diferentes da montanha. Ele segue firme em direção ao ápice, eu desço resistentemente de lá. Se fisicamente nossa diferença já se acentua, que minhas capacidades mentais continuem boas para que consiga ensinar a ele e à irmã que o ápice não é chegada é apenas mais um ponto de passagem e que na vida há inúmeros picos e vales. 

Afinal, o Corcel ainda transportava cinco pessoas pela rua Jardim Botânico cumprindo sua função principal, ser um carro. Bem, o jogador que tentava superar a ação inexorável do tempo arranjou dores nas pernas e nos braços, mas ainda conseguiu voltar para casa de bicicleta e continua a ser pai. 

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