segunda-feira, 30 de setembro de 2019

O blogueiro que caiu de joelhos

Algumas coisas estão tirando minha atenção deste blog. Reta final de dissertação do mestrado, correção de trabalhos e falta de inspiração, principalmente, fizeram com que esse espaço de expressão fosse relativamente abandonado. No entanto, alguns fatos ocorreram que me fizeram brigar contra a inércia cerebral e publicar um texto. 

O primeiro é que neste dia 30 de setembro o Blog do Creso completa dois anos. Foram 730 dias revividos em 456 textos. Com prole tão grande, impossível não escolher os prediletos. Mas eu não revelarei, pois eles, os textos, podem ficar com ciúme. 

Sim, acredito na vida própria dos textos. Creio que há alma nessas palavras, pelo descomplicado fato de  que muito da minha alma ficou espalhado por eles.  Então, o completar desses  dois anos foi a causa para a interrupção das férias do blog. Efeméride pela efeméride, um clássico do jornalismo preguiçoso. 

O outro motivo para escrever foram os 500 dias com um stent na minha artéria circunflexa. Essa efeméride foi no dia 20 de setembro, mas eu deixei passar e escrevo com 510 dias do meu infarto. 

O coração vai bem, os joelhos, nem tanto. Caí inapelavelmente na rua. Aquelas grades que fazem parte dos prismas de ventilação do metrô representam um risco na chuva. Desavisadamente, pisei e depois de uma “travada” nas duas pernas, minha carcaça foi projetada ao solo. Meu filho olhava com um misto de compaixão, assombro e um sorriso meio disfarçado. 

Foi quando um ônibus que estava na Muniz Barreto parou. O motorista abriu a porta da frente e perguntou ao meu filho: “ ele levanta sozinho”.? Com a dignidade tão em frangalhos quanto os joelhos, respondi: “sim”. Engatinhei para uma área menos escorregadia e levantei. 

Fiquei pensando se era algum carma porque ao participar do Manhã Paradiso no dia anterior dei nota zero para o discurso do presidente na ONU, para a política de segurança do Witzel e também ao Crivella pelos buracos na cidade. 

Depois pensei que o grande erro foi ter saído de All Star azul na chuva. O sapato inspiração do Nando Reis, eternizado pela voz da Cassia Eller, não tem solado antiderrapante. Deu uma nostalgia da infância, pois se eu tivesse de kichute não teria caído. 

Então, caindo e levantando com a imprecisão das batidas cardíacas, segue o blog, sigo a vida. 

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Jornalismo é para os fortes de espírito

A tragédia do Hospital Badim é um daqueles eventos em que o jornalista se ocupa da mais nobre das funções: prestar serviço à população. As emissoras de rádio se mobilizaram para levar informações sobre o incêndio, mas também do trânsito na região próxima e a identificação de feridos e mortos. 

Nessa hora, o rádio se destaca pela agilidade e por derrubar a programação de forma menos traumática do que a televisão. As emissoras passam a transmitir o fato imediatamente e todos os esforços são direcionados para atualização das informações. 

Nesta sexta-feira conversei com meu querido aluno Bruno Ourique, estagiário da Rádio Tupi.  Ele  fez questão de me contar que a chefia o destacou para ir a um dos hospitais que os pacientes estavam sendo transferidos. Na porta do Quinta D’ Or, Bruno encontrou a neta de uma das vítimas e conseguiu um material exclusivo com pessoas que estavam dentro da unidade. 

O que mais me chamou atenção é que os olhos dele brilhavam. Ele contava empolgado a aventura de ter que entrar no ar a todo momento e alimentar as redes sociais da emissora. Ele gostava do fato de não ficar cansado. Na verdade, ele me disse uma frase que revela seu estado de espírito: “quem está numa cobertura dessa e fica de saco cheio, querendo ir embora, não sabe o que é ser jornalista”. O tempo às vezes faz a gente perder essa disposição. Mas é muito importante a gente resgatar essa razão para a escolha da profissão. 

Tive muito orgulho de ouvir essa frase de um aluno. Jornalismo é um ofício que exige de quem a exerce devoção. Nem mais, nem menos do que isso. O brilho no olhar do Bruno ao contar a história me lembrou a minha empolgação quando há 22 anos comecei a fazer esse tipo de reportagem, na própria Tupi. 

O jornalista precisa aproveitar as oportunidades para se mostrar imprescindível, tanto para o público, quanto para os patrões, que muitas vezes cortam postos na atividade fim. Rádio deve ter radialistas e jornalistas ocupando a maioria das funções. O jornalismo feito pela Tupi nesta quinta-feira foi imprescindível. 

E agora é o momento do jornalismo se mostrar mais imprescindível ainda. Pois as razões do incêndio precisam ser investigadas. É necessário cobrar das autoridades se há outras unidades expostas a esse tipo de tragédia. 

Acostumamo-nos a pensar que todas as mazelas do setor estão na saúde pública. Em depoimento aos jornalistas, o filho de uma das pessoas mortas disse que os funcionários do Badim pareciam bater cabeça enquanto o incêndio aumentava. 

A tragédia tem que jogar luz para algumas questões. Por exemplo, os laudos para funcionamento do hospital estavam em dia?  As equipes são treinadas para medidas anti-incêndio? O hospital tinha uma brigada de incêndio? Outros hospitais particulares têm risco de viver algo semelhante?

Com a palavra as autoridades, a função de conseguir traduzir e divulgar as respostas desses questionamentos é dos jornalistas. Cobrar dos responsáveis medidas para que a população do Rio não seja testemunha daquela cena de colchões de plástico sendo arremessados pelas janelas, macas carregando pacientes com soro pelo meio da rua, pânico, correria e desinformação. 

E no meio disso tudo está o brilho no olhar de quem começa na profissão. Que durante o caos, o estresse e a tristeza mantém-se firme para cumprir sua missão. Jornalismo é solidário, jornalismo é para fortes de espírito, jornalismo é para os jovens de espírito e para quem entende a dimensão do trabalho que executa.  

domingo, 1 de setembro de 2019

O caminho é mais do que caminhar

O gol é mais difícil do que a cesta? Resolvi contrariar o bom jornalismo e começar esse texto com a pergunta. Na verdade, no jornalismo, assim como na vida, as perguntas são as grandes propulsoras. No entanto, no texto devem estar as respostas, quando muito, as perguntas que não obtiveram respostas também devem estar presentes. Mas não com uma clássica do interrogação, e sim  com a explicação que elas precisam ser respondidas. 

Mas esse texto não é sobre jornalismo, como você caro leitor, que ultrapassou a torrente confusa de ideias do primeiro parágrafo poderia supor. A questão é: o gol é mais difícil do que a cesta?

A minha resposta é quase cretina. Depende de quem chuta e depende de quem arremessa. Eu, por exemplo, fiz muito mais gols do que cestas na minha “carreira esportiva”. Fui um jogador razoável de peladas  futebolísticas até o fim do século passado. Nos primeiros anos deste século ainda tentei adiar minha “aposentadoria” dos gramados sintéticos, quadras, ou qualquer superfície plana que permitisse uma bola rolar, mas meus joelhos me obrigaram a parar. 

O basquete para mim sempre foi um mistério insondável. Como o arremesso descreve uma parábola perfeita e cai naquela cesta com o diâmetro um pouco maior do que o da bola lançada. Para a imprecisão dos meus movimentos é muito mais difícil anotar um acerto na quadra do que estufar uma rede. 

Do meu ponto de vista fazer gol é mais fácil do que marcar cestas. Minha hipótese leva a outro questionamento: se fazer gol é mais fácil do que conseguir uma cesta, por que os jogos de basquete têm placares mais movimentados do que  os de futebol?

Se esse texto fosse um ensaio acadêmico sobre atividades esportivas, a objetividade responderia essa hipótese secundária saída da principal de forma quase que enfadonha: a quadra é menor, o jogo é com as mãos, o que aumenta a precisão e outras diatribes técnicas que preencheriam laudas e laudas do artigo de algum PHD em ciência desportiva. 

Volto então à resposta nada acadêmica ou prescritivo: depende de quem joga? Resumir nossa vida a dois caminhos, “isso” ou “aquilo” com respostas que não se entrelacem contraria até a “exata” matemática, que na teoria dos conjuntos guarda um espaço para a interseção, que é aquele elemento que está em dois ou mais conjuntos, e que numa transposição para o texto ora escrito pode representar  a resposta “depende”. 

Viver não é fácil porque “depende” do próximo passo. Porque caminhar não é só andar para frente, há lugares de recuo, desvio, paradas e contemplação. Com licença ao meu mestre Giovanni Faria, que incontáveis vezes fez as rotas transcendentais de Santiago de Compostela, me permito fazer uma diferenciação. O caminhar é elemento fundamental do Caminho. No entanto, o Caminho é um conjunto que engloba muito mais ações do que o caminhar. Sentar, fotografar, refletir e se encontrar fazem parte do Caminho (grafado a partir deste parágrafo em maiúscula ao arrepio das regras gramaticais). 

Então, meu Caminho ao gol sempre foi muito mais curto e prazeroso do que meu Caminho à cesta. Desportivamente sempre escolhi estar no jogo de futebol, em vez de me arriscar na partida de basquete. Mas nesse caso, tive a oportunidade de escolher. No entanto, o que fazer quando os passos levam a gente por um Caminho em que não há conforto? Adaptar-se e tolerar, não vejo outra saída.  E num vão pensamento matemático, a soma de adaptação e tolerância pode resultar na capacidade de ter resiliência. 

Então, se você quiser uma partida de futebol, e perceber que por um engano ou pela força do acaso, a vida encurtar os espaços e começar a pegar a pelota com as mãos, adapte-se. Uma hora a bola volta a rolar e você consegue efetivamente participar do jogo.