segunda-feira, 30 de abril de 2018

A Rádio Globo é um vaso milenar

Outro dia vi uma discussão no Facebook sobre o alcance de posts no Instagram do programa do Otaviano Costa, na Rádio Globo, e do Show do Antônio Carlos, na Rádio Tupi. O post da Rádio Globo tinha 10 mil curtidas e o da Tupi, 61. Se os números não eram exatamente esses, a proporção era. 

Bem, a primeira coisa é que os programas não são nem concorrentes. Antônio Carlos vai ao ar das 6h às 8h. Otaviano entra no ar às 8h. Segunda razão, a Rádio Globo não está mais no segmento popular. A emissora buscou outro posicionamento, logo, qualquer tipo de comparação com a Tupi é querer medir o número de maçãs  a partir da quantidade de bananas. 

O público que a Rádio Globo busca tem mais o perfil do Instagram do que o ouvinte da Tupi. Então, essa “vitória” da Globo na rede social pode ser significativa  a médio ou longo prazo. Agora, não diz muita coisa. 

Se você quiser avaliar a Globo sem saudosismo , deve compará-la com a rádio com a qual buscou concorrer: a JB FM. Aí, pode ser avaliado o estágio da reformulação da emissora, que entrou no ar em junho do ano passado. A JB tem cerca de três vezes a audiência da Globo. 

Acho que esse número do Ibope  é o que menos importa aos gestores da emissora. Se você quiser ser um ouvinte atento, preste atenção aos comerciais. São eles que sustentam uma rádio. Se você começa a ouvir muitas chamadas da programação da emissora, é porque as vendas estão baixas. O índice mágico se chama “taxa de ocupação dos breaks”. 

A missão de quem foi para a Rádio Globo tem pouco a ver com propostas artísticas ou de audiência. A questão é financeira. Se a emissora der dinheiro, os donos e a diretoria ficarão satisfeitos. 

A audiência só não pode ser desprezada totalmente porque sem ela não se consegue vender comerciais na rádio. Não escuto mais a Radio Globo como já ouvi, mas quando sintonizo percebo poucos comerciais e muitas chamadas institucionais. Mas não posso cravar que a taxa de ocupação dos breaks está baixa. 

Se na audiência a JB já dá uma goleada, na ocupação dos breaks a diferença se acentua. Na JB, até a informação da hora certa tem patrocínio. Os intervalos são mais cheios que os da Rádio Globo, isso posso cravar. 

O SGR precisava encontrar uma solução para a Rádio Globo, que produzia rombos milionários. Olhou para a CBN e achou que poderia copiar a fórmula da rede e público qualificado para conseguir sucesso. A questão é que há alguns quadros que se assemelham nas duas rádios. O modelo de colunistas, por exemplo, aproxima os dois estilos. O perigo é a Rádio Globo começar a atuar na mesma faixa de público da CBN e dar origem a um processo de canibalização da co-irmã. 

A direção do SGR tinha muita esperança na Rádio Globo em FM na capital paulista. O problema é que a emissora ainda não aconteceu nem em audiência e nem em receita na praça mais rica do país. 

Uma das fórmulas do sucesso da CBN foi convencer o mercado publicitário que deveria somar a audiência do AM e do FM para se tornar competitiva. A direção da Rádio Globo, talvez por desinformação da estratégia já aplicada, fez o inverso. Nem cita mais as frequências em AM. A alegação é que manter os canais de AM é muito caro. É aquela coisa, para crescer não é só cortar, tem que investir também. 


O caso da rádio Globo é emblemático. Se conseguir ter êxito mudando completamente o público e a programação, será um caso a ser estudado nas universidades.  Se a rádio sair dessa aventura menor do que entrou, a direção vai ser comparado ao caso daquele discípulo a quem o mestre confiou a segurança de um vaso milenar. Quando o mestre se distraiu,  o discípulo deixou o vaso cair e transformou toda a tradição em pó. 

domingo, 29 de abril de 2018

Até tu, Beltrame?

Sempre me perguntei como José Mariano Beltrame nunca percebera e tampouco denunciara o esquema criminoso que drenava dinheiro dos cofres do Rio. Beltrame era um policial federal reconhecidamente competente. Ou seja, tinha fontes na instituição. Seria quase uma Louis Lane. Jornalista investigativa, que por causa de um par de óculos, não percebia que o Clark Kent era o Superman. 

O jornal o Globo traz  neste domingo uma reportagem informando que Carlos Miranda, um dos operadores do Cabralduto, homologou no STF um acordo de delação premiada. Nele, Miranda afirma que Beltrame teria recebido mesada de R$ 30 mil entre 2007 e 2014. 

Numa conta grosseira, seria a  apropriação indébita de quase R$ 3 milhões. A se provar a acusação, a cegueira ou incompetência trocam de nome. Transformam-se em conivência corrupta. 

Com sua mesada de R$ 30 mil, o xerife do Rio seria apenas mais um corrupto. No entanto, há o agravante de ter sido o responsável ao combate à corrupção policial e à violência no estado. Caberia a pergunta “Até tu, Brutus?” 

Entristece-me a possibilidade de Beltrame ser corrupto. Eu acreditei que o projeto dos UPPs era uma saída para o combate à violência no Rio. O ex-secretária dizia não acreditar que a solução era entrar nas comunidades atirando. Que o caminho era conferir cidadania às pessoas que moram em locais dominadas pelo tráfico. Os moradores são tão vítimas do que qualquer outra vítima. Com o agravante de terem que seguir as ordens de um “estado paralelo”. 

Carlos Miranda delata ainda o pagamento de prêmios ao governador Luiz Fernando Pezão. Fato que já não surpreende. Pezão consegue a proeza de ser um morto-vivo do Executivo fluminense. Seu mandato acabou quando foi decretada a intervenção federal. No entanto, ele vaga por inaugurações e assinaturas de convênio quase invisível. Quando o percebem é para vaiar. Teve quem achasse que a República do Chuvisco (os governos do casal Garotinho) teria sido o pior que aconteceu ao Rio  desde a redemocratização. Mal sabíamos que a quadrilha do Cabral seria mais nefasta. 

A se comprovar a acusação a Beltrame, está posta à mesa o perigo de mais uma paixão brasileira: a criação de heróis. A voz tranquila e o ar quase de monge de Beltrame seriam fachada  para mais um corrupto instalado em posto-chave da administração estadual.

Perto do que foi desviado, a grana da mesada do Beltrame seria irrisória, o que não tira o caráter corrupto do ato. Ao menos Beltrame se livraria do estigma de ser um policial incompetente. 


No entanto, por princípio, vou esperar as provas. Delatores não são corruptos arrependidos aptos a canonização. Para ser considerado criminoso o cidadão tem que ser julgado e condenado. Se bem que perante a lei brasileira tem uns que são mais iguais do que os outros e seus processos pegam a faixa seletiva e andam sem congestionamentos. Abaixo, a íntegra da nota do ex-secretário negando as acusações:

É com surpresa e desgosto que recebo a informação de que meu nome foi citado numa delação premiada. O delator, pessoa que mal conheço e que corre sério risco de passar os próximos 20 anos na cadeia, afirma que minha família recebeu mesadas por eu estar no Governo. É tudo o que sei, e pela imprensa.O denuncismo não é novidade para mim. Por dois anos fui inquilino de Paulo Roberto, assessor do então Governador Sérgio Cabral. Este assessor é agora citado como o intermediário que teria recebido as tais mesadas em meu nome. Oportunistas de plantão - em especial o ex-governador Garotinho - usaram e abusaram dessa história do imóvel, tentando fazer de meu inquilinato uma prova contra minha honestidade. Fui caluniado algumas vezes. Com os recibos dos aluguéis e minhas declarações de Imposto de Renda, venci todas as ações no Judiciário, com direito a indenizações reparatórias. Nunca recebi um centavo, embora seja direito meu. Uma Justiça que ainda não veio. E agora esta história de mesada fabricada por alguém que está coagido e, sabe·se lá porque, usando meu nome para jogar fumaça sobre os próprios dramas.

Venho a público me defender pensando principalmente nas pessoas que apoiaram, ajudaram, incentivaram e que,mesmo quando divergiam, mantinham uma relação respeitosa com meu trabalho. Que a política tenha sido contaminada pela sanha da corrupção, nos resta lamentar, punir e corrigir. Mas quero me dirigir, olhos nos olhos, a aquelas pessoas que confiam na minha integridade. Quero garantir a elas que esta acusação, além de fantasiosa, não tem
pernas. São as únicas metáforas que encontrei para substituir o já tão desgastado "absurdo".


Atenciosamente,


José Mariano Beltrame

sábado, 28 de abril de 2018

A Bahia Branca da novela da Globo

Fui pela primeira vez a Salvador em fevereiro. Voltei de lá impressionado com a beleza da cidade, via os nomes dos bairros e cantarolava musicas o tempo inteiro. Como fiquei perto do Farol da Barra cantei Pepeu Gomes compulsivamente (“do Farol da Barra ao Jardim de Alah, eu também quero beijar”).

A Bahia no geral e Salvador em particular  são lugares orgulhosamente negros. A cidade, como muitas outras do mundo, é de todas as cores, mas a herança africana está em tudo e é majoritária . 

Nesta sexta, um amigo que foi meu aluno e é um ator talentoso colocou uma frase no Facebook que chamou minha atenção e em princípio me intrigou: “só para avisar, segundo o IBGE, 80% da população baiana é negra”. 

Entendi a mensagem um pouco depois. A próxima novela das 21h da TV Globo será ambientada no segundo estado mais negro do Brasil (segundo o IBGE, em números percentuais, o Pará tem mais negros). Pela escalação do elenco já se vê que entre os protagonistas não há negros. Na reportagem do  Vídeo Show sobre o lançamento da novela, a única negra de destaque é a atriz Thalita Carauta. 

Essa foi a mensagem passada por meu amigo, que é ator e negro. Nem quando a novela é passada num estado significativamente negro, os protagonistas são pretos. 

Em termos econômicos, a diferença entre negros e brancos é cruel na Bahia. Segundo números do IBGE, a população preta e parda recebe cerca de 40% menos do que a branca. Outra estatística reveladora é a de que 17% dos mais  ricos baianos são negros, enquanto, entre os mais pobres, eles são 75%. 

A mesma TV Globo que dá destaque a Maria Julia Coutinho como “garota do tempo” no JN, que tem na série Mister Brau o protagonismo de Lázaro Ramos e Tais Araujo, leva ao ar um novela passada na Bahia sem protagonistas negros. O mUndo não é para principiantes. 

E olha que em 2018 tem a passagem pelos 50 anos da morte de Martin Luther King, o lançamento do Filme Pantera Negra e os 130 anos da assinatura da Lei Áurea, para citar alguns exemplos de símbolos da reafirmação do papel dos negros na sociedade. 

Está deflagrado e reafirmado um problema de representatividade. A realidade construída pela novela é de uma Bahia branca. E a Globo, sempre tão ciosa de que “o Brasil se veja” em seus programas e jornais, escorrega neste ponto.   

Vão me chamar de chato. Vão dizer que não tenho “lugar de fala” para reclamar da falta de negros protagonistas na novela da Globo, mas paciência. Não consigo ver essa questão e não me incomodar. Como diz minha querida amiga Carla Rodrigues, eu adoro colocar meu dedo na tomada, ou seja arrumar alguma encrenca. 

A questão fundamental é que o Brasil não “se vê” na telinha. No passado tivemos Sérgio Cardoso pintando o rosto de preto para fazer “A  Cabana do Pai Tomás”, hoje temos protagonistas negros deslocados do horário nobre, como no caso de Mister Brau, que entra no ar depois das 22h30m.  A série de Tais e Lázaro é importante, mas ainda é pouco. 


O Segundo Sol vai ser uma novela baiana sem negros protagonistas. O que parece evidenciar que as mídias brasileiras continuam a pintar o rosto para representar os negros, mas agora de maneira mais sutil do que no fim da década de 1960. 

sexta-feira, 27 de abril de 2018

A gente deveria gritar mais pelos motivos certos


Conversava com meu amigo e mestre Giovanni Faria sobre a vida. Aliás, conversar com Gio rende sempre boas histórias. Ele trabalhou 17 anos no Jornal O Globo e me contava que no momento do fechamento do jornal, o ritmo frenético provocava coisas inimagináveis: “uma vez um dos melhores redatores com quem trabalhei gritou: ‘mexer é com “x” ou com ch?’”

A pergunta não foi fruto de ignorância ou desinteligência, a questão é que submetidos a situações estressantes, as dúvidas que pareciam as mais elementares transformam-se num monstrengo. O grito do redator era um pedido de ajuda. 

Acho que todos nós temos que saber o momento certo de pedir ajuda. O orgulho, a insegurança ou medo de parecer imperfeitos tira-nos o recurso de pedir socorro. A dúvida do redator era relativamente fácil de ser resolvida. Mas há outras mais complexas e nos recusamos a tentar o auxílio de alguém mais experiente. 

Talvez o mundo esteja barulhento pelos motivos errados. O subir o tom de voz na hora de pedir auxílio deveria ser uma prática cotidiana. Mas a gente grita mais por ordens, divergências e ódios, não para pedir ajuda. 

Muitas vezes sentimos que os celulares, extensões de nossas mãos e de nossos cérebros, nos retirarão do “vale da sobra das dúvidas e das angústias”. No entanto, por mais memória e brilho que eles tenham, não devem substituir o olhar no olho e o toque das mãos em outras mãos. 

Da mesma forma que não gritamos para pedir ajuda, não falamos com os outros para demonstrar afeto. Chega-se ao ponto de pegar carona e não conversar com a pessoa do lado, coloca-se um fone no ouvido e deixa-se o que classicamente era definido como convívio fora das experiências cotidianas. 

Numa boa, a gente tem que gritar mais. Olhar mais nos olhos, ter mais dúvidas. Não se conformar com a distância das pessoas queridas. Quando os ambientes estiverem silenciosos, seja você o agente da desordem. Converse, puxe assunto. Ligue para seus amigos. Marque um chopp. É difícil, nossos tempos são opressores quando o assunto é agenda. A vida é mais do que a tela do celular. Claro, o conselho do barulho só não vale quando você estiver numa biblioteca.  

Barulhe-se sempre que possível!

quinta-feira, 26 de abril de 2018

Ser pai de adolescente é...

Amigos, filho não vem com manual de instruções. Sim, isso eu já sabia. No entanto, na adolescência os hormônios ficam em fúria, a velocidade do raciocínio aumenta exponencialmente e a capacidade de contestação vai a níveis indescritíveis. 

Sente-se com seu filho adolescente e tente levar uma conversa mais séria e elaborada sobre essas coisas chatas da vida. Algo como: “você precisa estudar”, “aprender a dividir seu tempo”, “largar o celular”, ou ainda dar conselhos como mandá-lo sair de casa e tomar um sol. 

Se você der sorte, encontra uma resposta silenciosa ou distante. Mas se os tais hormônios descritos acima estiverem no modo ativo, sai de baixo. 

A adolescência é um desencaixe. A começar pelas feições. É aquela idade em que o nariz cresce antes do resto do rosto, as orelhas também. A voz varia de um grave Vincent Price e um agudo Edson Cordeiro, no caso dos meninos. Algumas meninas já começam a encarar as vicissitudes da TPM. 

Este desencaixe transforma aquele ser risonho de outrora numa pessoa aborrecida. E aos pais resta ter muita paciência. Não tem outro remédio. Se tem, o detentor da fórmula ficaria milionário. 

Certa vez, ouvi de uma psicóloga, uma frase que até agora não sei se concordo: “meu chapa, você é pai, não é amigo. O limite quem vai dar é você. Tem espaço que só são ocupados pelos amigos”. 

Tento então uma utopia? Ser amigo do meu filho e ao mesmo tempo dar limites e educar? Realmente, o trabalho sujo, o de lembrar ao cidadão ou cidadã de quem se é progenitor de todos os códigos de ética e responsabilidade, não pode ser terceirizado.  Mas a amizade só será reatada no períodos pós-adolescência? 

Prefiro acreditar que não. Que a gente consegue permanecer amigo mesmo depois de todas as batalhas campais cobrando responsabilidades e compromissos. Numa boa, olhar o crescimento deles é recompensador. 

No entanto, a adolescência é um período de aprendizado também para os pais. Pois nós temos que praticar o desapego da ideia de que filhos são versões melhoradas da gente. Temos que aceitar que filhos não são versões, são obras originais que vão gravar sua marca no mundo. 

Tem um momento que a gente é só o farol, na ponta da praia para iluminar o caminho. Não somos o motor do barco, apenas o colocamos para navegar. 

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Romário e seus dribles

O senador Romário foi um dos maiores jogadores do futebol mundial. Para quem não acompanhou, vou dar uma explicação sucinta. Sabe o Salah, do Liverpool? Pois é, não engraxa a chuteira do camisa 11 da seleção de 94. 

Romário era um jogador “sonso”. Quando se achava que ele estava desligado do jogo, deixava o dele na rede do adversário. Numa das partidas mais impressionantes que já acompanhei, a decisão da Copa Mercosul de 2000, ele fez 3 gols na virada do Vasco em cima do Palmeiras por 4 a 3. O último gol foi Romário em estado puro. A bola o procurou e ele só teve o trabalho de empurrar para dentro e decretar a vitória. 

Pois bem, Romário gênio da grande área, apelidado assim por ninguém menos do que Johan Cruyff , tentou dar um dos seus dribles sensacionais na justiça eleitoral. 

Como quem não quer nada, Romário encaminhou uma consulta para saber se poderia ser candidato ao Senado novamente. Ele ganhou o mandato na eleição de 2014 e só termina em 2022. No entanto, Romário pensava em aplicar o que se chama no “futebolês” de “migué”, atitude de quando se quer enganar alguém. 

Se ele pudesse ser candidato de novo, poderia se eleger e o mandato se estender até 2026. Detalhe, a segunda metade do mandato de 2014 seria exercida pelo suplente de Romário, que não foi submetido ao voto popular. 

Os ministros sentiram a intenção do herói do tetra, e o desarmaram quando entrava na área. 

Romário, gênio da bola, dá umas “pixotadas” no campo da política. Ameaça sair candidato aos cargos no executivo, depois desiste e negocia seus apoios. 


Isso sem falar nos bens que Romario tentou esconder para não pagar dívidas, segundo a justiça. Ah, Romário, os zagueiros de hoje são mais perigosos. Eles não caem facilmente na sua ginga de corpo. 

terça-feira, 24 de abril de 2018

Acho que nunca mais vou me "libertar das algemas"


Amigos, Hoje faz dois meses que a fitinha do Senhor do Bonfim está no meu braço esquerdo. Realmente, não sei o que fazer com esta fita amarela de poliéster amarrada no meu punho. Parece um tipo de algema posta por minha crendice para me aprisionar.

Nos primeiros momentos da fita no meu braço, procurei um consolo pensando nela como um relicário da deliciosa viagem a Salvador. O tempo foi passando, as despesas no cartão de crédito chegando e nada dela arrebentar. Ou seja, pela tradição, enquanto a fita não arrebentar os desejos não se realizam. Amigos que vão à capital baiana, cuidado, não se deixem aprisionar por essas “algemas”. Essas fitinhas não arrebentam de jeito nenhum.

Nesses dois meses muita coisa aconteceu. A Gleice ganhou o BBB e gritou Lula Livre, isto porque o Lula foi preso enquanto a fita de Nosso Senhor do Bonfim permanecia em meu braço. O Aécio virou réu no Supremo e o Alckmin vai escapar sem muitos arranhões graças a uma “jogada” bem armada no STJ. Por falar em jogada, o Flamengo, foi eliminado do carioca, mudou de técnico e perdeu o Evérton, jogador mais regular do time.

Fico pensando no que ainda vai acontecer enquanto esta fita estiver no meu braço. Acho que ela já testemunhou coisa demais. A fita está demorando tanto que parece que na novela O Outro Lado do Paraíso, a mocinha Clara vai concretizar a vingança contra a vilã Sofia e vai ter final feliz com o Patrick. Na vida real, ela está namorando o Gael... Periga começar a outra novela e eu não me despedir da fita.

Os leitores do blog não têm me ajudado muito. Nenhum deles se arriscou a me incentivar a tirar a fitinha. Um deles ainda me deixou sem esperanças, enviando-me uma reportagem com exemplos de fitas que demoraram mais dois anos para arrebentar. Outro foi enfático e me disse: “NÃO TIRE DE JEITO NENHUM!” Diante de tão acalorado conselho, deixei-a ficar no meu braço.

Fiquei pensando que se a minha fita demorar dois anos para arrebentar, ela vai saber a nova seleção campeã do mundo no futebol, acompanhar o começo da campanha de reeleição do Trump e – Deus, socorra-me – a campanha de reeleição do Crivella. Aí já vai ser demais. Estará atestado que essa fita não se mete em política.
  


segunda-feira, 23 de abril de 2018

FHC começou a “atirar” em Barbosa

Fernando Henrique Cardoso está lançando um livro. Ok, isto não é novidade, antes de presidente, ele já era escritor. Chama-me atenção o momento. O ex-presidente lança a obra na hora que começam a ser definidos os atores do quadro eleitoral de 2018. 

Fernando Henrique usou a entrevista de lançamento de Crise e Reinvenção da Política no Brasil para jogar o primeiro torpedo na direção do nome de Joaquim Barbosa. É bom que se tenha em mente que. o ex-ministro do Supremo correria na raia do almejado “centro”, numa diferenciação da direita, representada por Jair Bolsonaro, e da esquerda, que tem como principal nome o ex-presidente Lula, virtualmente fora da disputa. 

Com a elegância e as meias palavras que caracterizam suas fala, Fernando Henrique torpedeou Barbosa dizendo que é perigosos transformar juiz em líder político. Num mundo interdisciplinar, querer colocar um juiz fora espectro político é mais retórica do que crença. Barbosa ê um adversário que canaliza voto dos insatisfeitos que eventualmente poderiam desaguar no PSDB. 

A entrevista à GQ tratou ainda da transformação de Aécio Neves em réu no Supremo. FHC deu o chamado “beijo da morte” no senador mineiro. O ex-presidente disse que acontecerem coisas lamentáveis, que não tem nada a ver com o partido. Ou seja, Aécio é Aécio e PSDB é PSDB. Bem, com um pouquinho de senso crítico, vemos que as coisas não são bem assim. 

No trecho divulgando pelo portal Globo.com, não havia nenhuma menção à Geraldo Alckmin nem para o bem, nem para o mal. Significa?

Como tudo na vida, pode ser muita coisa ou pode não ser nada. Uma coisa na resenha do livro publicado na Folha de S. Paulo me pareceu curiosa. “Fernando Henrique demonstrou estar em plena forma”. 

Fernando Henrique não parece empolgado com o nome de Geraldo Alckmin. O balão de ensaio na forma de Luciano Huck já mostrava isso. Se Geraldo Alckmin não decolar, não duvidaria que um político experiente e em plena forma fosse o candidato tucano. 


domingo, 22 de abril de 2018

Tenho chorado pouco ultimamente

Ando chorando pouco. Isso não é necessariamente bom. O choro é o contato mais intuitivo e inevitável com as próprias emoções. A conclusão é que tenho estado um pouco desconectado das minhas emoções. 

Estar desconectado das emoções revela quase um certo distanciamento da realidade íntima. Os inúmeros desafios diários que a vida nas grandes cidade nos impõe fazem com que o tempo para o ócio e contemplação fiquem cada vez menores. Às vezes, o momento de respirar e pensar na vida surge entre um passar de marcha e outro, enquanto você está preso num congestionamento. 

A metáfora do carro é apenas uma das que podemos utilizar para se referir à falta de tempo. Hoje resolvi sair de casa com um único objetivo: sair. Olhar a rua, olhar o mar, a Lagoa, as pessoas fazendo exercícios. Todos com o objetivo de adiar o inevitável. 

Caminhei pela Lagoa e resolvi sentar num deck e sozinho tentar ter um contato com as minhas emoções. A beleza da cidade costuma me emocionar. Um dia, ver a cara do Cristo à bordo de um helicóptero fez com que algumas lágrimas brotassem dos meus olhos. Então sentei no deck à beira da Lagoa para induzir o contato com “as minhas emoções”. 

Pois bem, o cenário era lindo, pedalinhos com formato de cisne transportavam casais aparentemente apaixonados e família dedicadas a fazer do dia de descanso um lazer produtivo. 

Não aconteceu nada. Minhas emoções não afloraram em lágrimas, mas num pouco de irritação. Um grupo resolveu sentar ao meu lado. Uma das pessoas jogava e pegava continuamente uma garrafa plástica semi vazia e provocava um barulho irritante na madeira do “deck”. 

Cada um aproveita democraticamente o seu dia. Resolvi abstrair o barulho. Logo depois um menino de não mais que 2 anos chega e grita para a avó: “olha a piscina”.  Se referindo à Lagoa. Fui despertado de minhas emoções. A avó era aparentemente da minha idade. 

Então é isso, tenho à idade de avós. Despertei de meus devaneios fui trazido à condição humana e mortal, percebi que o sol estava me queimando e eu não tinha passado protetor. 

Em homenagem ao meu amigo Luciano Garrido termino este texto com uma cena de Kung Fu Panda. O mestre Shifo tenta descansar após uma batalha e a tagarelice do Panda não permite. Assim como o personagem do desenho, resolvi adiar o contato com minhas emoções para uma outra vez. 


sábado, 21 de abril de 2018

Você conhece a LDRV ? (Edit 1)

Uma amiga leu o post sobre LDRV de ontem e me contou uma história curiosa. Um parente dela se assumiu gay há pouco. A mãe não aceitou muito bem. O restante da família do rapaz é do interior e teoricamente não sabe. 

No entanto, o menino, que anunciou a orientação sexual,  fala desabridamente sobre seu relacionamento na página. O curioso é que parentes do moço também estão na LDRV. 

O menino talvez se sinta protegido pelo código de ética da página, em que as histórias deveriam ficar secretas. Talvez esse mecanismo de solidariedade e cumplicidade digital surpreenda a nós, das gerações mais velhas. 

O grupo parece ser draconiano em algumas regras. A LDRV é explícita. “É proibido vazar ou ameaçar vazar conteúdo para fora dele. Bem como intimidar membros conterrâneos por conta de seus comentários”.  A punição é sumária: banimento. Leia outras “leis” para quem é da LDRV:

  • “Campanhas, vaquinhas e doações podem ser divulgadas normalmente desde que sejam para cessar necessidades básicas de pessoas trans, casos de doenças fatais em humanos ou para ajudar pessoas carentes”. 

  • “Proibido divulgar redes sociais, páginas ou eventos com fins lucrativos”.  Ah, até divulgar spoillers é considerado ato passível de banimento. 

Paradoxal. Vivemos o mundo de posts patrocinados, prática capitalista para se apropriar das redes sociais. No entanto, esta página que é um nicho, onde a publicidade poderia usar uma estratégia de jogar uma “rede para pescar num pequeno tanque”, se trancou para publicidade. 

 Ao que tudo indica, há muito tempo Lana Del Rey deixou de ser a força motriz da página. Ela é apenas uma ideia. Talvez alguns que se interessem em entrar na página nem conheçam direito a cantora. Aliás, não duvido que alguns ignorem mesmo. 

Ela deu o nome, mas a página virou um organismo vivo que se realimenta de vários fóruns. Até quem não é fã de Lana Del Rey pode ter espaço na LDRV. 

Meus queridos alunos, para brincar com meu ímpeto “tiozão” de tratar do tema, começaram uma “mini-tour” por causa do meu texto que descreve a página. No entanto, tenho um problema real. Não alcancei o grau de liberdade interno para participar deste fórum. 

Na LDRV as mensagens são postadas e reprocessados. As narrativas ganham mais força com os adendos dos comentários ou os próprios “edits” dos autores. 

Há um pesquisador americano chamado Henry Jenkins que escreveu um livro chamado Cultura da Convergência. Os conselhos, confissões, viralizações que acontecem na LDRV são a exemplificação prática da teoria do escritor.  

Com os sucessivos “edits” aquela história pode se tornar uma “tour” infinita. Já imagino que com o tempo, poderão ser planejadas séries digitais passadas apenas em fóruns como a LDRV. 

Confesso que fiquei até um pouco assustado com as regras impostas para participar da página. Não sei se um grupo de um milhão de pessoas poderá ser controlado de maneira tão severa. Na prática, as histórias vazam. 

Acho que não serei aceito. Como postou um dos meus alunos, se eu entrar vou ser expulso por vazar conteúdos da página. De fato, isso irá acontecer, não vou mentir. Parafraseando Marx, o Groucho, não me parece interessante entrar  em clubes que me aceitem como sócio. 


sexta-feira, 20 de abril de 2018

Você conhece a LDRV?

Uma menina precisava de uma revista que tinha um artigo para usar no seu trabalho de conclusão de curso, o famigerado TCC. O orientador, com quem ela não mantinha relação das mais cordiais, tinha a publicação, mas negava o empréstimo . Dizia que ela não era responsável e que a revista era rara. No entanto, depois de muita insistência, ele emprestou. A menina foi ao banheiro e esqueceu a revista. A moça da limpeza jogou fora. Sem saber o que fazer, ela postou a história numa página do Facebook chamada LDRV. Depois de milhares de curtidas e conselhos, uma pessoa arrumou para ela outro exemplar da revista. A moça pode devolver ao professor no prazo.

Na mesma página, um jovem pediu conselhos para uma crise grave. Era gay e não sabia como contar aos pais. E perguntava o que fazer. 

Se você tem menos de 35 anos e não é uma pessoa descolado, provavelmente não conhece a página. Então, eu, que nem sou tão descolado assim, vou explicar. A página LDRV significa Lana Del Rey Vevo. Por partes: Lana Del Rey é uma cantora americana que tem uma voz bonita e umas musicas que soam um pouco melancólicas. No entanto, faz a cabeça de uma galera e agrada muito a meninos e meninas gays. Não sei se é possível classificá-la como diva., vou até perguntar aos meus alunos fãs.Ah, Vevo é um portal de música e entretenimento. 

A LDRV tem um dialeto próprio e se pretende secreta, apesar de ter quase um milhão de pessoas inscritas na página. Provavelmente você já usou alguma palavra ou expressão nascida lá. Exemplos: Homão da Porra, para definir um homem bonito; ranço, para descrever uma sensação incômoda com alguém ou com alguma situação; flopar, para dizer que algo deu errado, ou ainda, isso ou alguém é um hino, para atestar a qualidade do objeto. 

Na LDRV há um vocabulário próprio para os processos internos. Quando uma história como a da revista viraliza, ela se transforma em uma “tour”. Se a história que deu início à “tour” é atualizada, o autor dá um “edit” para que a audiência fique por dentro do que está acontecendo. Aliás, a expressão “fique por dentro” é totalmente anti-LDRV. 

Os posts contam casos light, mas há revelações para vários tipos de gosta, com o mais variado nível de intimidade e explicitação. Não é tão fácil entrar na LDRV. Algum integrante tem que convidar. Depois o autor da página analisa o perfil do pretendente para ver se ele está apto a ter acesso aos posts. 

O fato que a LDRV é um daqueles casos que ficam fora do radar de uma faixa etária mais velha. É uma coisa de jovens, com jovens e para jovens. Sem o manual de instruções fica difícil para o quarentão, próximo de se tornar um cinquentão se achar. 

Só soube da existência da página porque sou um privilegiado. Convivo com jovens que integram à LDRV. O que me impressiona é isso passar ao largo do meu entendimento, é mais uma prova de que no mundo digital em que eles estão inseridos, as tribos encontram uma linguagem mais própria, distante de quem está fora do circuito. 

E não adianta você querer posar de descolado, pois é inútil. Uma das minhas alunas até me convidou para participar, mas acho que se fizerem uma análise minuciosa do meu perfil vão descobrir que eu não me encaixo. Até porque, para ser aceito, eu não devia ter revelado as histórias que estão lá. 

Este fenômeno comunicacional é um grande barato, mas é desafiador para quem precisa se adaptar. Códigos próprios e sistemas próprios sempre existiram. Juridiquês, economês e que tais são formas que as  categorias profissionais, por exemplo, encontraram para se se preservar e se identificar. O que caracteriza a LDRV é um corte mais transversal. Não é uma afinidade profissional, é um enquadramento sem enquadramento. Qualquer assunto pode virar post e post virar “tour”. Não há pauta tangível. Ê diferente de uma página política, religiosa ou musical. É tudo isso e nada disso. A linguagem é desabrida, revelações íntimas são jogadas num fórum de um milhão de pessoas. Isso mesmo, um milhão de pessoas.  

Os tempos mudaram e quando a gente esquece disso acaba por se surpreender. Para mim o impressionante é que a página tem quase dois anos e eu só fui conhecê-la essa semana. Então amigos, pensem no seguinte. Quem é mais novo tem muito a ensinar e se a gente não quiser aprender, vai ter dificuldade no futuro até para falar. 









quinta-feira, 19 de abril de 2018

João Gilberto e o abandono dos ídolos

O drama de João Gilberto é um reforço na velha história dos gênios atormentados. Tudo nele é peculiar. Conta o evangelho da Bossa Nova, que ele inventou a batida diferente e refundou o jeito de cantar durante uma introspectiva temporada na casa da irmã. Lá ele descobriu que o banheiro tinha a acústica ideal para o jeito suave que ele queria emitir a voz . 

As lendas em torno de João são quase tão grandes quanto às histórias. Não querer ruídos, mínimos que fossem, em apresentações ao vivo. Se irritar com o som da casa de shows, ou simplesmente cancelar os recitais. Tudo isso faz parte do mito João Gilberto. 

O fato é que ele é o último sobrevivente da Santíssima Trindade bossa-novista. É o mais novo e conseguiu ultrapassar o tempo de vida de Vinicius de Moraes e Tom Jobim, que morreram aos 67 anos. 

Com os avanços da medicina, João chegou a uma idade avançada, mas há muitas pessoas de sua geração que levam uma vida em plena atividade. Só no campo artístico podemos citar Silvio Santos, Fernanda Montenegro, Laura Cardoso e Lima Duarte. 

João Gilberto é gênio. Acho que meu primeiro contato com ele foi ao ouvir O Pato. Depois tive minha fase Rock Brasil, mas voltei minha atenção para a música dele novamente e não larguei mais. Não sou especialista em música, mas João carrega em si o conceito de “menos é mais”. Alguém muito mais afiado nas palavras do que este escriba aqui disse que cabe uma escola de samba no violão de João Gilberto. 

A reclusão, as excentricidades e o mito em torno do cantor podem estar cobrando a conta neste momento em que ele deveria ser alvo de todas as homenagens. 

As últimas notícias sobre a briga familiar em torno de seu patrimônio são desalentadoras.  Ameaças de despejo, perto da falência, e agora desorientação mental ao ponto de oficiais de justiça não poderem comunicá-lo sobre um processo abalam a imagem de um dos símbolos do que de melhor o Brasil produziu. 

Sei que em tempos de defesa de um estado mínimo, posso até ser apedrejado pelo que vou especular, mas acho que este seria o caso do Ministério da Cultura interferir. Entender se pode fazer alguma coisa pelo cantor. João Gilberto é um patrimônio cultural brasileiro. O Brasil deveria se mobilizar para ajudar. João Gilberto. 

É preciso reverenciar o mito e ajudá-lo quando ele atinge sua dimensão humana. Quando ele se for, pouco vai adiantar medalhas com o nome dele, ruas, praças ou feriados. Não deixemos que João Gilberto se irmane na tragédia com o que Garrincha foi no futebol. 

Dona Ivone Lara, a Dama do Samba, morreu em um hospital público. Em um país que respeitasse seus ídolos teria uma velhice tranquila, cercada de conforto e bens materiais. 


O país fica mais pobre ao abandonar João Gilberto e perder Dona Ivone Lara. 

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Aécio não é nem “churrasquinho de 5ª”

Impressionante, o destino da família Neves parece não ser o de presidir o Brasil. Numa das eleições mais apertadas da história, Aécio Neves perdeu a Presidência em 2014, mas se credenciou para comandar o PSDB e provavelmente ganhar a eleição em 2018. 

No entanto, no meio do caminho aconteceu o escândalo da JBS  e muitas acusações para ele dar conta. No intervalo de 4 anos, o neto de Tancredo Neves passou a viver um ocaso político. Seria necessário um efeito “fosfosol ao contrário” para deixá-lo apto a disputar com alguma chance eleições presidenciais no Brasil.

Como bem definiu Bernardo Mello Franco, em O Globo, Aécio é fósforo queimado. Não apostaria em celeridade no seu processo no STF, mas mesmo sem condenação, seu filme com os eleitores está bem queimado. Se conseguir ser candidato, deveria tentar a vaga na Câmara, para não correr o risco de ficar sem mandato e sem foro. 

No entanto, pessoas com bom senso não devem usar a transformação de Aécio em réu para proferir frases do tipo “pau que dá em Chico, dá em Francisco”, numa comparação rasteira com o caso do ex-presidente Lula. Em primeiro lugar, não é possível comparar o que aconteceu a um e a outro em absolutamente nada. Aécio foi protegido de todas as maneiras pelos pares. O Joesley-gate explodiu ano passado. Levou um ano para que a denúncia contra Aecio fosse acolhida.  Em segundo lugar, não há uma prova tão contundente contra Lula como as que incriminam o senador mineiro. 

Aécio era filé em 2014, hoje não passa de carne de quinta. “Fritá-lo” não gera nem um cheiro digno daqueles “churrasquinhos de gato” vendidos em alguns lugares do Brasil. 

Se a justiça brasileira não estivesse com a venda levantada, escolhendo quem é igual perante a lei é quem não é, outro tucano estaria enrolado. Geraldo Alckmin seria investigado pela Lava-Jato por crime de corrupção e não pela justiça eleitoral. 

Alckmin estaria na pole-position das investigações da Lava-Jato. Comandou o estado mais rico do Brasil e há fortes indícios de relações pouco republicanas com empreiteiras. Como sabemos, numa manobra conseguiu responder só pro crime de Caixa 2. No entanto, sua largada frouxa na corrida presidencial o coloca em posição de fragilidade. Não duvidaria se o nome de Doria começasse a ser aventado para o Planalto, deixando Alckmin como candidato ao Senado. 


Mas é tudo especulação. O certo é que o “Centro” ficou em polvorosa quase libidinosa com o desempenho de Joaquim Barbosa nas pesquisas. Esta eleição promete fortes emoções. 

terça-feira, 17 de abril de 2018

Dona Ivone Lara e as sementes do Egito

Ouvi durante uma aula do mestrado que sementes esquecidas durante milênios nas pirâmides do Egito não perderam a capacidade de germinar. Tendo em vista que a aula era de Teoria das Narrativas, fiquei na dúvida se era verdade ou mito. 

Então, caro leitor, não tome como verdade científica, aceite apenas o significado poético da frase. Uma semente ficar esquecida milênios e se manter íntegra é sinal de que a essência pode ser preservada. 

Cabelos caem, barrigas crescem, articulações se desgastam, mas a capacidade de sonhar permanece intacta. Sonhar é a nossa capacidade de germinar. 

Os projetos nascem nos sonhos, depois, como canta Beto Guedes, preenchem de horizontes o tempo acordado de viver. Nos meus sonhos converso com meus pais e com todas as pessoas especiais que já convivi e não posso mais ver neste plano. 

Quem sabe a aparição deles na hora em que durmo seja essa essência das sementes do Egito. Aparecem porque continuam a germinar mesmo que já tenham deixado meu convívio diário há 15, 20, ou 25 anos. 

As sementes do Egito se prestam a todo tipo de metáfora. Elas são campeãs de resiliência. Foram esquecidas e esperaram milênios pra voltar a fazer o que delas se esperava: gerar novas vidas. 

A existência delas faz com que a gente entenda também a nossa dimensão diante da natureza. As sementes não obedecem a uma escala humana de temporalidade. Enquanto alguns privilegiados chegam a uma centena de anos, elas estão há milênios conservadas. 

Numa licença permitida pela prosopopeia , podemos dizer que as sementes do Egito testemunharam guerras, mudanças de Faraós, a queda de Roma, de Constantinopla e da cabeça de Maria Antonieta. Elas viram as derrotas de Napoleão e Hitler, a marcha de Mao -Tsé-Tung e a chegada homem à lua. 

As sementes do Egito são o eu-lírico da Canção “Eu nasci há 10 mil anos atrás”, de Raul Seixas. Elas permanecem, nenhuma pessoa que você conhece, viveu ou viverá o que elas já passaram em uma existência. 

Quando você estiver se sentindo o dono da situação, crente que é o maioral, pense nas sementes do Egito, elas terão o dom de devolver você à condição humana e mortal. 


Há ainda uma forma de sobreviver. É por meio de sua obra. A música de Dona Ivone Lara, por exemplo, será como as sementes do Egito. Vai germinar sonhos por muitas gerações. 

segunda-feira, 16 de abril de 2018

Nossas viagens diárias

Acho que este fim de semana foi o primeiro que efetivamente não teve cara de verão na cidade do Rio de Janeiro em 2018. Não é que de março para cá não tenha chovido, é que os termômetros resolveram dar uma aliviada. 

Vai começar aquele época do ano em que amanhece mais tarde e anoitece mais cedo. Como faço parte da tribo das 6h da manhã, acontece aquela sensação de acordar de noite. Por mais que você durma cedo, olhar pela janela e os postes da rua ainda estarem acesos dá uma sensação de que a noite de sono foi curta. Y

Realmente não posso reclamar. Nos meus tempos de repórter e de chefe de reportagem na CBN eu acordava às 5h15m. Entrava na emissora às 6h, ou seja, na hora que acordo, em outros tempos, já estaria trabalhando. 

Ouço os relatos das meus alunos que moram mais longe da universidade e me assusto. Como sempre dei sorte de morar relativamente perto dos locais que estudei, penso que o esforço deles é muito maior do que o meu. Tem uma galera que leva até três horas para chegar à faculdade.

As histórias destes alunos reafirmam em mim a triste sensação que o poder público não zela pelo transporte. As histórias no BRT são desrespeitosas. Há os caras de pau que invadem o vagão das mulheres no metrô, o motorista de ônibus que não para no ponto... Como ouvi de uma aluna: “às 7h30m já foram tantos violações de direitos, que a gente nem se dá conta”. 

O grande desafio  é não deixar que o esforço nos embruteça e impeça de viver a vida com doses de poesia e prazer. 

No meio do ritmo acelerado, procuro pequenas coisas para me emocionar e vestir de lirismo a rotina. Nem que seja a lembrança de uma musica, o comentário sobre o futebol no fim de semana, ou compartilhar alguma história que alivia a barra das incertezas e angústias. 

Eu também olho fotos dos meus filhos em varias idades. Essa é uma das vantagens da tecnologia que a gente não pode desperdiçar. Nessas horas agradeço a obstinação da minha mulher por querer registros fotográficos de vários momentos. 

A gente consegue viajar um pouco até o momento que as fotos foram tiradas. Neste texto que fala de rotinas, acabo  por apelar à metalinguagem. 

Escrever é uma das atividades rotineira que me propus. Pretendo cumpri-la diariamente. É menos nobre do que pegar três conduções para trabalhar ou estudar, mas em alguns momentos, pode ser desafiador, doloroso e compensador. 

Quando nasce o texto é aquela sensação de desembarcar do ônibus cheio. Acho que acabo de criar uma metáfora vulgar. Escrever é uma viagem de ônibus. Tem dias que você vai sentado, com o trânsito bom e chega rápido. Há outos, com a condução cheia, trânsito engarrafado e motorista mal-humorado. 

Esta crônica nasceu como fruto de metáforas pobres e frases a procura de um sentido. O que importa é que a chegada de agora é a partida de daqui a pouco. O ponto final de um texto é o elemento gráfico e simbólico que precede o título do próximo.