quarta-feira, 20 de março de 2019

Olho por olho

A lei do Talião data de quase quatro mil anos. Alguns a consideram a lei escrita mais antiga da história da humanidade. É aquela exemplificada na expressão “olho por olho, dente por dente”. Um princípio tão atavicamente ligado à nossa formação cultural, que permanece presente até hoje. 

Agredir quem nos agrediu é instintivo. Desenvolvemos a nossa Lei do Talião desde pequenos: “se você não me emprestar o seu carrinho, eu não empresto a minha bola”. Ao crescer, muitas vezes o adolescente ouve dos pais: “não traga ofensas para casa, bateu, levou”. Com tanto esmero na formação desse “revidador”, na fase adulta o que mais fazemos é aplicar informalmente a lei que se aprendeu na Babilônia. 

A declaração do Major Olímpio, líder do PSL no Senado, de que se os professores tivessem armas, tragédias como a de Suzano seriam evitadas é movida por esse sentimento de reciprocidade a qualquer agressão. 

A lei do “olho por olho” é primitiva. Por exemplo, como punir reciprocamente o atirador que deixou 50 mortos na Nova Zelândia? Ele não tem 50 vidas. A lei mais dura com ele é a solução. Mas o que evitaria uma barbarie como essa? Conscientização de que somos todos iguais. Que a violência não é caminho para paz. A palavra é acolhimento, um conceito diametralmente oposto à construção de muros nas fronteiras, ao expurgo de migrantes e a rejeição de refugiados. 

Ao rever os casos de Suzano e da Nova Zelândia fui tomado por esse sentimento primitivo da Lei do Talião. Como escrevi acima, ele é atávico na nossa formação cultural. A diferença é que alguns, como eu, passam dessa primeira fase reativa e pensam que o revide só aumenta a escalada de violência. 

Eu lamento profundamente que os dois fascínoras que cometeram o massacre de Suzano tenham morrido. Vivos, eles poderiam pagar por seu crimes bárbaros e ainda poderiam ajudar, involuntariamente que fosse, a entender a rede de ódio que os incentivou a cometer tamanha selvageria. Mortos, são heróis de gente doente. Na prática, as mortes deles pouco ajudaram para evitar novos ataques de ódio. 


A primeira mudança começa perto da gente, nas nossas atitudes, nas nossas escolhas. Quando optamos pelo convívio e não pela exclusão do diferente. A gente ajuda a desmontar a bomba atômica de Suzano, de Realengo e de Colunbine quando entendemos que há razão também nos que pensam de forma diversa. Uma coisa é certa: ódio gera ódio. Aumentar o número de armas circulando vai matematicamente aumentar o número de mortes. 

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