sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Flávio Bolsonaro e Lutero Vargas

O jornalista Elio Gaspari costuma “psicografar” cartas de personagens históricos para pessoas de hoje em dia. Ele deveria usar suas habilidades do além e falar com Flávio Bolsonaro sobre Lutero Vargas. 

Nascido em 1912, Lutero tinha 18 anos quando o pai chegou ao Palácio do Catete e estava com 42 no fatídico dia 24 de agosto de 1954. Nesse meio tempo, o primogênito de Vargas se formou em Medicina e se tornou deputado federal. 

Na volta do pai ao Catete, se meteu numa encrenca por ter intermediado dinheiro para que Samuel Wainer conseguisse abrir o jornal “Última Hora”. O caso acabou em pizza porque a base parlamentar getulista conseguiu barrar as punições contra o primogênito do presidente. 

Era inimigo declarado de Carlos Lacerda. O jornalista conspirador chamava Lutero de “Filho rico do pai dos pobres”. A hostilidade era tanta que ele foi citado nas investigações sobre o atentado da Rua Toneleros que matou o major Ruben Vaz e precipitou o fim do governo Vargas. Nada foi provado contra Lutero. 

A primeira lição que Flávio deveria tirar é que qualquer uma de suas ações está ligada ao pai. Isso vale para o bem, quando o sobrenome garantiu-lhe expressiva vitória na eleição para o Senado, quanto para o mal, como agora no Queiroz-Gate. 

Ao saber que tinha “telhado de vidro” o primeiro-filho deveria ter se afastado do pai. Ou ao ter em um mês 48 depósitos num total de 96 mil reais, Flávio Bolsonaro achava que não seria investigado? Se pensava assim, das duas uma: ou o senador eleito é de uma ingenuidade atroz, ou acreditava piamente que a nova ordem lhe garantiria a impunidade. O pior é se as investigações mostrarem que o laranjal irrigou a conta do patriarca. Vai ser algo difícil de explicar. 

Bolsonaro deveria estar tocando a agenda das reformas, notadamente a da Previdência, no entanto, terá que agir para minimizar as estripulias de Queiroz/Flávio. Se a ação de Lutero Vargas pra financiar Samuel Wainer foi mais um foco de desgaste para o pai, Flávio Bolsonaro é responsável pela primeira crise seria no governo Bolsonaro. A bandeira anti-corrupção era uma das principais da campanha. Não se esperava que antes do primeiro mês alguém do clã fosse pego com a boca ma botija. 

A entrevista à Record, uma das empresas amigáveis à nova ordem, não será suficiente para encurtar a crise. Pegou mal entrar com a liminar para conseguir o foro especial. Foi o recurso de alguém que tinha algo a esconder. 

Talvez o patriarca tenha que deixar o primogênito pelo caminho para escapar ileso do Queiroz-Gate. Getúlio não jogou o filho aos leões, mas ao final da crise deu cabo a própria vida. E Bolsonaro tem na sala de espera alguém louco por deslizes. O vice-presidente, Hamilton Mourão, já disse que o episódio envolvendo Flávio precisa ser esclarecido. Se Michel Temer esperou seis anos para conspirar contra Dilma Roussef, há dúvidas se o general Mourão terá tanta paciência. 


Jair Bolsonaro não vai sair dessa crise com bravatas e espalhando fake News. Vai ter que ser firme para que a faixa não escape pela cabeça e vá parar no peito do vice-presidente.  

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