segunda-feira, 17 de junho de 2019

Alcione, a diva Marrom

Alcione e Nana Caymmi talvez sejam as últimas representantes da era das divas da MPB. Esse clube já contou com Angela Maria, Dalva de Oliveira, Elizeth Cardoso e Maysa. Elis Regina, Maria Betânia e Gal Costa se encaixam em outro estilo. Divas requerem vestidos longos e nada discretos, cabelos armados, originalidade e muita potência vocal. Divas são kitches, não são bregas, favor não confundir. Divas são a tradução musical de um filme de Almodóvar. 

A “Marrom” (ela só se refere a si mesma assim) tem tanto carisma, que ele transborda do palco. Na temporada que terminou neste domingo no confortável Imperator, isso ficou bem explícito. Na verdade, seria mais correto chamar o evento de Talk Show da Alcione. Ela conversou com o público após todas as músicas. Isso mesmo, ela não emendava as canções e o público fiel morria de rir, interagia e urrava de felicidade. 

Aos 71 anos, Alcione mostrava sinais de cansaço. Uma temporada bem sucedida, com ingressos esgotados em todos os dias. E olha, são 750 lugares, não é uma casa pequena. Logo na primeira fila, tinha uma fã mais exaltada que interrompia a cantora. Sem se estressar, a Marrom deu uma descompostura na mulher e a fã sossegou.. Alcione não perdeu a viagem: “quem vai fazer o show, eu ou você”? A moça ficou quieta e Alcione continuou “divando”. 

A cantora levou a apresentação por causa do seu carisma. Um dos recursos usados pela diva foi passar a bola para o público em alguns trechos das canções. Um assistente levou água e café para a cantora algumas vezes para que ela aguentasse o desgaste. 

Só sendo diva, com anos de majestade, para driblar uma rouquidão normal em fim de temporada. Alcione homenageou Jamelão, Clara Nunes e Beth Carvalho. Contou inúmeros “causos”. Chamou a sobrinha para dividir o palco, mas o ponto alto foi quando cantou seus grandes sucessos. O público entoou junto em delírio os versos de Minha Estranha Loucura e Meu Ébano. 




Vou torcer para que Alcione realize um desejo que revelou na apresentação: gravar um disco só com músicas de Benito di Paula. Um aperitivo foi a interpretação da clássica Retalhos de Cetim. 

Alcione é daquelas artistas que já fazem o que querem no palco. Se dá ao luxo de não dar bis e nem por isso ser chamada de arrogante. O que ela faz com o seu público é uma experiência afetiva. Não há o distanciamento de outros grandes nomes da música brasileira. Não é um recital em que a estrela demonstra seu virtuosismo vocal. A Marrom é virtuosa musicalmente, mas o que vale é a interação emocional dela com a plateia. 

No meio do show lembrei do grande Loureiro Neto. Alcione era ouvinte dele e algumas vezes ligava para o estúdio e dava sua opinião sobre o tema que estava no ar. Alcione é uma diva “gente como a gente”. Tão “gente como a gente” que chegou a falar sobre o seu tratamento dentário ao agradecer a equipe que a atendera. Em setembro a cantora volta a se apresentar no Rio. Se você não assistiu, não deixe passar a oportunidade, é imperdível

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