domingo, 16 de dezembro de 2018

O jornalismo, Steve Jobs e as árvores

Estava vendo um documentário  sobre Steve Jobs. Numa das cenas resgatadas, o  fundador da Apple faz sua entrada na conferência anual e é ovacionado. Na primeira fila, um homem aparentemente mais maduro era o único a não aplaudir. Ele tinha um caderno de notas. Olhei para o meu filho e disse: aquele ali é o jornalista. 

Por mais que admiremos alguém, e o mito criado em torno de Jobs é admirável, o velho jornalista me lembrou que a profissão também engloba desafinar o coro dos contentes. 

E uma das coisas que o filme, que já tem algum tempo, mostra é que Jobs era frio, maquiavélico, intimidador de jornalistas, explorador das relações quase servis dos trabalhadores chineses, entre outras coisas. Curioso, pois escrevi esse texto num dos equipamentos inventados pela equipe do empresário. O paradoxo faz parte do viver. 

E o jornalista está lá. Ele vai fazer as perguntas incômodas. Porque se não houver perguntas incômodas, as pessoas públicas agem ao seu bel prazer. Então, não adianta fazer carinha feia, esbravejar e fugir. Os jornalistas estarão lá para ser aquele calo que mostra a necessidade de andar direito, para que a pessoa não se machuque. 

Orgulhosamente, faço parte desta tribo. E honestamente, não gosto de conselhos sobre o que não devo falar. Prefiro sugestões sobre assuntos que devo me debruçar. Dessa forma, posso aceitar ou descartar a ideia. 

Steve Jobs intimidou jornalistas que fizeram uma reportagem sobre um I-Phone em fase experimental esquecido num bar. A intimidação foi tão forte, que até a polícia invadiu a casa do repórter. 

Um dos entrevistados do filme disse que todas as vezes que fez reportagens com críticas à Jobs, havia inúmeros comentários desancado o artigo. O documentário não levanta essa questão, mas hoje, diante do que ocorreu nas eleições americanas e nas do Brasil, não duvido de robôs, ou de milícias virtuais tentando desacreditar as matérias contra Jobs. Ele era tão visionário, que mesmo morto em 2011, pode ter inventado essa estratégia. 


Além do documentário, vi no mesmo dia um filme sobre Jobs. Uma das frases do filme é emblemática: “Deus mandou seu filho único em uma missão suicida, e todos gostamos dele porque nos deu árvores”. Logo, dependendo das árvores que recebemos, esquecemos do sacrifício a que poderemos ser forçados. A frase de Jobs era cínica. Seu cinismo o levou longe, mas o fez ter uma péssima relação com a filha mais velha. Nem todas as “árvores” valem o sacrifício. Só as de verdade. 

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