domingo, 5 de agosto de 2018

Minhas 10 novelas inesquecíveis


O principal critério para a escolha das novelas foi que eu tenha conseguido vê-las no momento em que passou, ou pelo menos, que eu tenha conseguido acompanhar alguma reprise. Por exemplo, Beto Rockfeler é uma novela revolucionária de Bráulio Pedroso, transmitida na TV Tupi, em 1968. Não acompanhei nenhuma reprise, portanto, só posso louvá-la pelo que a crítica fala dela, não pela minha experiência. Já Irmãos Coragem é de 1970, mas foi reprisada e eu pude ver, logo, ela vai entrar na minha seleção. Ao fazer as escolhas não pude esconder uma preferência: Gilberto Braga. Ele é autor de 4 das minhas 10 novelas preferidas. Bem, vamos às obras. 

10° Lugar - Irmãos Coragem. Janete Clair (1970). 

A saga de João Coragem contra o impiedoso Pedro Barros é cativante. Tarcísio Meira no auge como o garimpeiro que descobre um diamante que muda a vida dele e movimenta todo o roteiro da novela. Irmãos Coragem libertou a TV Globo das obras da cubana Glória Magadan, que contava histórias que nada tinham a ver com a realidade brasileira. Dentre os diversos méritos de Irmãos Coragem está a formação do primeiro casal inter-racial da TV brasileira, formado por Milton Gonçalves e Suzana Faini. A música de abertura de Nonato Buzar e Paulinho Tapajós * é uma das mais significativas da história das telenovelas. 

* o leitor Luís Guto me corrigiu. Eu tinha posto Geraldo Vandre e Theo de Barros. 

9º Lugar - Escrava Isaura - Gilberto Braga (1976)

A novela que lançou Lucélia Santos ao estrelato me provocou muitas lágrimas. Fiquei muito triste quando as personagens dos atores Roberto Pirilo e Norma Blum morreram num incêndio na senzala. O Leôncio vivido por Rubens de Falco era tão mau, que eu morria de raiva e de medo dele. Lucélia Santos era linda. Confesso que não sei se vi a novela na primeira vez ou em alguma das várias reprises. A música de abertura cantada por Dorival Caymmi é fortíssima e o seu “lerê, lerê” serve até hoje como trilha sonora quando se quer retratar um momento de exploração e muito trabalho. 

8º Lugar - Baila Comigo - Manoel Carlos (1981). 

Tudo era instigante na novela. Nesta trama aparece a primeira Helena de Manoel Carlos, vivida pela maravilhosa Lilian Lemertz. Ela era mãe dos gêmeos João Victor e Quinzinho, vividos por Tony Ramos. Os dois foram separados ao nascer e a trama gira em torno disso. A cena em que os dois se encontram foi impressionante e a"trucagem" foi revolucionária para os padrões da época. Tony conseguiu fazer os dois personagens com pegadas inteiramente distintas. Um clássico das novelas brasileiras. 

** Traído pela memória, escrevi que a música de abertura era interpretada por Rita Lee, o leitor Luís Guto me corrigiu novamente. A abertura era a música numa versão instrumental. Feitas as correções. Obrigado, Luís Guto. 

7º Lugar - Água Viva - Gilberto Braga - 1980.

Essa novela me marcou por causa da música de abertura. Menino do Rio, na voz de Baby Consuelo. Além disso, várias pessoas com windsurf navegavam na abertura. Ah, como eu queria aprender a andar naquelas pranchas com vela. A trama ocorria em torno da órfã Maria Helena, vivida por Isabela Garcia. Acho que foi a primeira vez que me apaixonei por alguém na televisão. A história de Maria Helena é a chave da narrativa. Havia também a disputa dos irmãos Nelson e Miguel Fragonard vividos por Reginaldo Farias e Raul Cortez. Lembro que a morte de Lucy Fragonard, mulher de Miguel, vivida pela atriz Tetê Medina, me assustou demais. Ela morria na explosão de um barco na casa de Angra. Lucy era carismática e doce, o tipo de mãe que todo mundo queria ter. Uma novela com todos os elementos “gilbertobraguianos”. 

6º Lugar - Dancing Days - Gilberto Braga (1978/79).

Julia Mattos (Sonia Braga) sai da cadeia e tenta conquistar o amor da filha Marisa (Glória Pires). No entanto, a menina foi criada pela irmã de Julia, Yolanda (Joana Fomm). Ela faz tudo para impedir a reaproximação. Dancing Days marcou época porque estava totalmente afinada com seu tempo, tanto na moda, quanto na trilha sonora. A febre das discotecas chegava ao Brasil e se propagou em boa parte por causa da novela. Dancing Days era moderna, os personagens falavam gírias e palavras mais próximas da realidade do telespectador. A trama é um dos maiores fenômenos do horário nobre da TV Globo. 

5º Lugar - Ti Ti Ti - Cassiano Gabus Mendes (1985/86). 

A trama girava em torno da guerra de tesouras entre os costureiros  Jaques Leclair e Victor Valentim, vividos por Reginaldo Faria e Luiz Gustavo. Tinha elementos de Romeu e Julieta já que os filhos de ambos se apaixonaram. Malu Mader, linda, era a Valquíria filha de Leclair. Cassio Gabus era Luti, filho de Valentim. Esse foi o papel imediatamente anterior de Malu ao de Lourdinha, em Anos Dourados. Valquíria foi o carimbo no passaporte de Malu Mader como musa da minha geração. A trilha sonora era cantada pelo grupo Metrô, um sucesso efêmero do Rock Brasil. 

4º Lugar - Que Rei Sou Eu - Cassiano Gabus Mendes (1989). 

Jean Pierre era o herdeiro do trono de Aviland, e por manobras políticas foi alijado do poder. O bruxo Havengard, eminência parda da corte, controla ministros corruptos e coloca no trono Pichot, um ex-mendigo, que preparado por ele torna-se um déspota. Cassiano Gabus Mendes usa uma alegoria de capa e espada para denunciar as maracutaias do Brasil. O elenco tinha Edson Celulari, Giulia Gam, um teatral e maravilhoso Antônio Abujamra e outras estrelas da história da TV. Houve gente que enxergou na luta entre o Jean Pierre de Celulari contra o Pichot de Tato Gabus uma reprodução do duelo entre Collor e Lula. A mensagem seria de que um proletário ao chegar o poder, no caso Pichot, se transformaria num tirano e que o trono deveria ficar nas mãos do nobre de nascença. A favor desta teoria da conspiração existe o fato da novela ocorrer em meio a primeira eleição presidencial depois da redemocratização. Aqui, o que me  interessa é a novela. Que Rei Sou Eu é entretenimento de primeira. 

3º Lugar - Avenida Brasil - João Emanuel Carneiro - (2012)

A vingança de Nina contra Carminha, a vilã que a separou da família e a mandou para um lixão. Esse era o mote da novela que parou o Brasil e rendeu milhões para a Rede Globo com a venda para o exterior. As tramas da novela não eram novas, mas o que fez com que Avenida Brasil se transformasse em fenômeno é o mesmo motivo de Dancing Days: a total identidade entre o que acontecia na tela e a realidade brasileira. Avenida Brasil falava da ascensão da classe C ocorrida no governo Lula e nos primeiros anos do governo Dilma. Tufão, um craque milionário, continuou morando no Divino, bairro onde nascera. Além disso, morava numa casa enorme em que a família inteira também residia. O núcleo cômico formado pela família de Tufão era sensacional, destaque absoluto para Leleco e Murici, os impagáveis Marcos Caruso e Eliane Giardini, os pais de Tufão. Tinha a empresária que veio de baixo, representada por Monalisa, dona de um salão de beleza. João Emanuel tenta de alguma forma reproduzir este núcleo cômico em O Segundo Sol com a família de Beto Falcão, mas apesar de bons resultados, não conseguiu o mesmo êxito. E tinha Carminha, a maior vilã das novelas brasileiras do século XXI. 

2º Lugar - Roque Santeiro - Dias Gomes - com participação de Aguinaldo Silva - (1985/86)

Para se ter uma ideia da força desta novela, basta saber que as sessões de teatro da cidade eram adiadas para não concorrer com a novela, pois seria derrota certa. A novela foi encenada 10 anos depois do previsto. Com tudo pronto para estrear em 1975, uma conversa entre Dias Gomes e o historiador Nelson Werneck Sodré foi grampeada pelos militares. Nela, Dias Gomes relatava as metáforas políticas que pretendia expor na trama. Resultado, a censura proibiu e a novela só foi ao ar em 1985. Tudo acontece na fictícia Asa Branca, onde uma elite poderosa e conservadora enriquece às custas de uma mentira construída em torno da falsa morte de Roque Santeiro (opa, será que João Emanuel Carneiro se inspirou neste mote para a trama de Beto Falcão?). Ele teria tentado defender a cidade de um bandido chamado Navalhada. A novela era uma metáfora do Brasil, com as forças conservadoras tentando manter a mentira e a oposição tentando jogar luz nos fatos. Havia discussões importantes na época. Uma delas era o embate na igreja católica. O conservador padre Hipólito, vivido pelo inesquecível Paulo Gracindo, fazia vista grossa para a mentira em torno de Roque Santeiro. Já o padre Albano, de Cláudio Cavalcanti, queria que se revelasse toda a situação. Albano também é colocado à prova por se sentir atraído pela jovem Tania, interpretada por Lídia Brondi. José Wilker dava vida a Roque Santeiro, mas a novela foi dominada pelas interpretações arrebatadoras de Lima Duarte, como Sinhozinho Malta, o vilão mais amado da TV, e de Regina Duarte, a fogosa Viúva Porcina. A novela tem um ingrediente extra nos bastidores. Dias Gomes e Aguinaldo Silva tornaram-se inimigos depois dela. 

1º Lugar - Vale Tudo - Gilberto Braga (1988/89). 

Raquel Acioly era guia turística em Foz do Iguaçu. Ela se separara do marido e morava com o pai. Quando o pai morre, a inescrupulosa filha Maria de Fátima vende a casa sem que a mãe saiba e vai para o Rio de Janeiro. Raquel se desespera, junta o que restou e vai atrás da filha. A vida de Raquel não é fácil, mas, trabalhando, ela sobe na vida. Fátima se aproxima do ex-modelo César Ribeiro e dá o chamado “golpe do baú” em Afonso Roitman. Tudo com a anuência de Odete Roitman, talvez a maior vilã das novelas brasileiras. Vale Tudo mostrava a ressaca do governo Sarney, comandado por uma elite insensível, que não se importava com as diferenças sociais. O Marco Aurélio vivido por Reginaldo Farias representava estes canalhas. É clássica a cena em que ao fugir do país, depois que suas maracutaias são descobertas, ele manda uma “banana” para o Brasil. Vale Tudo era inovadora por trazer o romance entre as personagens Cecília e Lais. Outra questão importante discutida foi o alcoolismo de Heleninha Roitman, vivida por Renata Sorrah. A personagem Solange, último papel de Lídia Brondi na TV, também discutia a possibilidade de ser mãe solteira por opção. Na novela foi cunhada a expressão “produção independente” para descrever a situação. Vale Tudo é daquelas obras difíceis de serem superadas pelo próprio autor. Gilberto Braga tentou fazer uma releitura da novela em Babilônia. Sua Heroína era a Regina, interpretado por Camila Pitanga, também batalhadora e que vendia comida na praia, tal qual Raquel Acioly. A vilã era a Beatriz, vivida por Glória Pires. Mulher que cometia assassinatos e fazia atrocidades para manter seu status. Os próprios nomes das personagens, Regina, a heroína, e Beatriz, a vilã, era uma sutil homenagem à Regina Duarte e à Beatriz Segal, protagonistas de Vale Tudo. No entanto, Babilônia não funcionou. Mas vamos celebrar Vale Tudo e aproveitar que a novela está sendo reprisada no Canal Viva. 

Vou dar um tempo nas minhas coleções e volto com elas a qualquer hora. 

5 comentários:

  1. Concordo com todas, Creso, só faltaram (pra mim) Gabriela e o Bem-Amado!! Bjs!!

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  2. Bom dia! Só duas correções:
    1) a música de abertura de "Irmãos Coragem" e de autoria de Nonato Buzar e Paulinho Tapajós.
    2) a música de abertura de "Baila comigo", embora de autoria de Rita Lee, e executada de forma instrumental (por Robson Jorge e Lincoln Olivetti, saudosos).
    No mais, texto maravilhoso, uma viagem no tempo!

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  3. Boas escolhas. Senti falta de Guerra dos Sexos que foi uma revolução no horário das sete, mas aí é questão de gosto também. Quanto à Lídia Brondi, Vale Tudo não foi o último trabalho dela na TV. Ela ainda fez Tieta e Meu Bem Meu Mal - essa sim, sua última novela. Abraços!

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