domingo, 26 de agosto de 2018

Ninguém mais ri por último

Este blog anda meio devagar, talvez o motivo seja uma certa “seca” de ideias do escriba. Quem sabe eu esteja precisando ler mais Baudelaire. Assim me inspiraria no jeito das crianças em olhar as coisas como se tudo fosse novidade. Seria uma forma de encontrar mais objetos para os textos. 

Pensei em banalidades para tentar tirar a poeira dos neurônios e ver se é possível chegar a um bom assunto para as crônicas. 

Fui à casa de um amigo e vi uma inovação tecnológica que imaginava apenas nos Jetsons. Ele tem uma máquina que mediante uma programação, aspira a sujeira da casa. Fiquei pensando que não há mais como deixar a sujeira embaixo do tapete. É só programar o aparelhinho mágico e zás, lá se vai a poeira para as calendas gregas, ou melhor, para o filtro do aspirador. A mulher dele se assustou num dia em que acordou e o robô já fazia a limpeza da casa. 

Fiz um exercício e pensei em alguns ditados populares que caíram em desuso diante da tecnologia. Em contrapartida, pensei em outros que se encaixam perfeitamente em nossos tempos. Por exemplo, “as aparências enganam”. Às vezes você vê uma foto no Instagram, depois ao constatar pessoalmente, a imagem não é bem aquela. 

Há outros que podem ser mal interpretados. “A voz do povo é a voz de Deus” é um que não se pode mais levar em conta. Afinal, a voz do povo hoje é selecionada por algoritmos e cada grupo ou página tem seu próprio Deus. Não há uma voz una, na verdade nunca houve, mas agora essa falta de unidade fica mais explícita. 

“Caiu na rede é peixe”. Hoje pode ser nude, ou quem sabe, ciber-bullyng. Peixe é algo analógico e só cai na rede em perfis fitness do Instagram. 

E por falar em perfis fitness, o ditado “de médico e de louco, todo mundo tem um pouco” permanece atual. Afinal, as pessoas têm sempre receitas para clarear dentes, curar frieiras, ou melhorar o funcionamento do intestino. Tudo compartilhado naquele perfil super popular. 

“Devagar se vai ao longe” é um daqueles que nos nossos tempos não pode mais ser dito. Com aquela conexão de baixa velocidade, você não consegue nem baixar aplicativo com joguinho de paciência. Ainda mais “ir” a algum lugar. Esse, definitivamente foi derrubado pelas novas tecnologias. 

Em compensação, “diga-me com quem andas e te direi quem és” está mais atual do que nunca. E descobrir com quem alguém anda está cada vez mais fácil. É só dar aquela “stalkeada” básica para saber quem são os amigos da pessoa. 

“Escreveu, não leu, pau comeu” mudou um pouco de sentido para se adaptar aos nossos dias. Receba uma mensagem da sua namorada pelo WhatsApp e experimente não responder de imediato. O pau vai comer, cantar e todas as outras metáforas que representam conflitos de grandes proporções. 

“Para bom entendedor, meia palavra basta”. Este não vale mais. Por um simples fato: não existem bons entendedores. Existem apenas “entendedores”. São aqueles que sabem de tudo e não aceitam outras opiniões. Os bons entendedores caíram em desuso, tal como a máquina de escrever e o Orkut. 

“Quando um burro fala, o outro abaixa a orelha”. Esse também não dá mais para usar. As pessoas não falam mais, elas apenas “teclam”. E ao “teclar”, respondem sem ler as perguntas, cegas em suas certezas. Abaixar a orelha é sinal de tolerância. Tolerância é tudo que não temos em nossos tempos. 

“Quem ri por último, ri melhor”. As histórias não acabam. Se elas não acabam, não há possibilidade de rir por último. É um ciclo sem fim. As discussões só terminam em duas ocasiões: quando a bateria de um dos “adversários” acaba, ou quando um deles morre. Pensando bem, hoje em dia, acabar a bateria e morrer são quase a mesma coisa. 

Eu poderia falar outras dezenas de ditados e esse texto não teria fim. Mas acho que um ditado está mais certo do que nunca: “quem semeia vento, colhe tempestade”. Quem quer paz, não pode defender violência. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário