sábado, 1 de setembro de 2018

Foi como entrar no túnel do tempo







De repente, me vi novamente aos 11 anos. Chutava violentamente a bola contra o muro, na vã esperança de que a derrota  do Brasil para a Itália fosse mentira. Vivi uma experiência de entrar no túnel do tempo ao acessar os jardins da Casa Firjan em Botafogo. Quem quiser visitar o novo espaço na Zona Sul pode ir à Rua Guilhermina Guinle 211. No entanto, para mim, será sempre o número 19 da Rua Dona Mariana, ou o “parquinho”. 

De 1976 a 1983 eu fui lá  praticamente todos os dias. No endereço morava Francisco Eduardo de Paula Machado, ou o Dr. Francisco. Ele era um dos herdeiros do clã. Seus pais, Linneo de Paula Machado e Celina Guinle construíram o palacete e ele, por ser o filho mais velho, ficou no imóvel. 

Ele abria os jardins das 9h às 17h pra que as crianças do bairro pudessem brincar.  Muitos bebês das redondezas tomaram seus primeiros “banhos de sol” por lá. Nós, um pouco mais velhos, brincávamos no balanço, na gangorra e pegávamos os jambos  que caíam das árvores. Tinha também um fruto que a gente chamava de “ovo de macaco”, mas esse nunca comi, até porque, acho que não era para comer. Fazíamos tudo isso, mas não podíamos pisar no gramado e nem chegar perto do casarão. Se a brincadeira avançasse em direção ao palacete, o Zé porteiro chamava a atenção do pessoal. 

Eu era o Juninho e conseguia entrar no parquinho mais cedo, ou em horários que não funcionasse, porque meu pai trabalhava no escritório dos Paula Machado. Por isso, consegui entrar após o jogo do Brasil com a Itália na Copa de 82. 

Aos 12 anos, fui informado que já estava grandinho demais para continuar indo ao Parquinho. Bem, também é uma fase que os interesses começam a mudar. Logo, há mais de 35 anos anos não entrava nos jardins do casarão. 

Em 2018 entrei na casa. Infelizmente, o Zé não está mais na portaria. Aliás, o portão do número 19 da Dona Mariana está fechado, pois como disse, o endereço agora é Guilhermina Guinle 211. O casarão ocupa um quarteirão inteiro e tem acesso pelas duas ruas. 

Logo na primeiro andar do palacete há vários totens em que são mostradas pequenas biografias dos industriais pioneiros do estado do Rio de Janeiro. Há muitos nomes de praça e ruas por lá. Tem a história de Guilherme da Silveira, magnata da indústria fabril. Hoje ele dá o nome oficial ao estádio do Bangu. Outra menção indireta a ele é que na música Três Apitos, de Noel Rosa, a “fábrica de tecidos” citada pertence à SIlveira. 

Tem também Irineu Marinho.  O perfil conta como o pai de Roberto tentou expandir suas atividades de jornalista. Irineu, participou da criação do jornal A Noite. Depois, sofreu um golpe empresarial e por esse motivo fundou o jornal O Globo. 

Sempre que leio essa história, penso que há participação da família Marinho nos dois principais veículos de comunicação eletrônica do país. A TV Globo é evidente, mas na da Rádio Nacional é quase imperceptível. A Rádio Nacional, antes de ser encapada pelo Governo Vargas, pertencia ao grupo A Noite. Por diversas dívidas, o grupo se viu obrigado a ceder a emissora à União. O resto está nos livros e na memória do país. 

No entanto, a história e a Firjan conseguiram reconciliar algo que seria impensável no início do século XX. Um dos pioneiros retratados é Percival Farquar. Ele se tornou conhecido do grande público ao ser mencionando na  minissérie Mad Maria. Farquar era um empresário americano que viu a oportunidade de investir no setor de energia no Rio de Janeiro. Para isso criou a Rio Light. No entanto, um dos ramos de negócio dos Guinle era esse. Os dois grupos empresariais entraram numa disputa pelos negócios e por quem tinha mais poder de influência nas esferas públicas. Apesar de contemporâneos, é provável que Farquar nunca tenha entrado lá em vida. Aliás, ele não devia ser bem quisto no palacete de Botafogo. 

Por dentro, foram restaurados os azulejos e o piso. Houve a adaptação com elementos contemporâneos. Estão previstos espaços para um café e um pequeno teatro. Uma pena que a Firjan tenha colocado no segundo andar escritórios. A entidade  poderia ter deixado aberto para visitação e instalado os escritórios num belo prédio construído no terreno. 


No mais, queria acompanhar meu amigo Marcelo Passamai e o pai dele numa visita ao palacete. Seu Jairo foi mordomo de Francisco Eduardo e conheceu o velho casarão como poucos.  Gostaria de uma visita guiada por seu Jairo naqueles corredores. O passado daria novas cores a presente com a colaboração deles

4 comentários:

  1. Meu amigo! Venho às lagrimas com esse seu texto. Ao lembrar de nossa infância, da nossa adolescência. Vivemos juntos nesses jardins, pelo destino, seguimos a mesma profissão e hoje temos além de tudo isso, uma amizadade eterna. Obrigado. Vives no meu coração .

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  2. Quero ir junto nessa visita. 😉😘

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