sábado, 9 de dezembro de 2017

Para além da Rua Dona Mariana (ou crônica de um aluno relapso)







Revisitar o passado é revivê-lo. Seguindo a sequência que arbitrei para a retrospectiva que me propus fazer em dezembro, hoje é o capítulo da expansão das fronteiras para além da Rua Dona Mariana. 

A primeira ruptura que meu mundo sofreu foi a saída do Joaquim Nabuco, aos 13 anos. Minha família achou que eu teria que mudar de escola para melhorar minha base educacional. A ideia era que eu me preparasse para as provas das escolas militares.  

Passei dois anos no Tamandaré, um colégio/curso no Centro em que o foco eram os concursos. Não cheguei nem perto de passar nas provas para o Colegio Naval, Epcar e Especex. 

O Tamandaré  era angustiante e competitivo. A cada bimestre havia uma movimentação das turmas. Tive um desempenho escolar medíocre nessa fase. Havia 6 turmas por turno. Nessa divisão a M1 era a turma dos melhores alunos e a M6 era a dos piores. Eu tinha um lugar quase fixo na M3. Um bimestre, por acidente, fui parar na M2. Do Tamandaré só levei para a vida a amizade com o Alex, que foi meu padrinho de casamento uns 15 anos depois. 

Fui aprovado na oitava série, mas como não passei em nenhum concurso, minha família decidiu que em vez de ir para o segundo grau (atual ensino médio), eu deveria fazer o curso novamente. Foi como se eu tivesse repetido a oitava série. Ir para a escola sem obrigação de tirar as notas exigia uma postura madura que não consegui ter. Um dia, muito angustiado, não saltei do ônibus na Avenida Presidente Vargas. A linha era a 438. Ao passar pela Rua General Canabarro, me deparei com o Cefet. Lembrei-me que algumas pessoas faziam concurso para lá, mas não fazia nem ideia do que se estudava no local. 

No fim do ano me inscrevi para a prova do Colégio  Naval e do Cefet. Não tenho o menor registro de meu desempenho no concurso militar. Sei que foi pífio. 

No Cefet eram 750 vagas. Mesmo com minha preparação indolente, havia alguma chance. Eram duas etapas. Na primeira classificavam-se 1500. Fiz a prova e na primeira fase fiquei em 668º lugar. A segunda etapa era de Matemática e Português, com redação. Foi um bomba, caí 164 posições, indo para a de número 832. 

Crise na Dona Mariana, aquela posição marcava meu fracasso acadêmico nos últimos dois anos. Nova ordem lá em casa, me matriculei no Colégio Estadual Infante Dom Henrique, onde faria o segundo grau. Tive uma semana de aula, quando chegou um telegrama na minha casa...

Eu não acreditei no que li. Eu tinha sido reclassificado. Nem sabia que isso poderia acontecer. Volta e meia falo de minha obsessão por números, pois é. Se tirarmos a média  do 668 da primeira fase com 832 da segunda, encontramos 750. Ou seja, o acaso da matemática mandou um recado. Eu sei que isso foi só coincidência. O fato é que mais de 100 pessoas aprovadas no Cefet desistiram e esse estudante relapso conseguiu entrar. 

No Cefet, um novo horizonte se abriu. Era um ambiente de faculdade no segundo grau. Fiz grandes amigos, vindos de vários muitos da cidade. Tinha o Renato, do Jabour, tinha o Rafael, vindo de Jacarepaguá, o Renatinho da Tijuca, o Ricardo, de Nilópolis, e o Alexandre, que era meu vizinho em Botafogo. Em 2017 fui nas comemorações de 30 anos dessa turma. No entanto, só estudei com eles um ano. 

Um ano antes de entrar no Cefet, tinha feito teatro na Casa Ruy Barbosa, tido minha primeira namorada firme e não estava com cabeça para essa coisa “desimportante” chamada estudo. Minha relação, que sempre boa com a Matemática, sofreu uma ruptura irreparável. Além disso, Física e Desenho Técnico completaram o serviço. Fui para a recuperação e, claro, o que se desenhava há algum tempo aconteceu. Fui reprovado. 

Vários aspectos levam um aluno à reprovação. Raramente se explica por alguma falta de capacidade intelectual. Imaturidade, irresponsabilidade e desinteresse fazem parte desta receita. A bronca mais ruidosa que levei foi do velho Creso.  Sem alterar o tom de voz ele foi lacônico: “Confiei em você”. O olhar de decepção onde antes só havia cumplicidade teve o efeito de um balde d’água fria na minha cara. E tal qual qualquer melodrama clichê, representou uma virada. 

Meu desempenho acadêmico a partir dali melhorou muito. Não voltei a ser o bom aluno que fora em todo ensino fundamental. Nos 4 anos restantes do Cefet passei direto duas vezes e fiquei de recuperação outras duas. Tenho diploma de técnico em Edificações, que nem sei onde anda. 

Na verdade tento fazer com que meus filhos entendam que você aprende na dor ou no amor. Eu aprendi na dor. No entanto, não adianta, eles vão traçar o caminho que conseguirem. Eu só posso educar e torcer. Filhos são flechas que lançamos no mundo por mais que a gente tente mirar, não controlamos a trajetória. 

4 comentários:

  1. Amigo, apesar do seu tal desempenho ruim no CEFET, vi surgir ali um grande líder, um amigo leal, pessoa participativa e que já realizava suas primeiras conquistas

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  2. Um enorme presente termos nos tornados amigos. Na verdade irmãos de pais diferentes. Adorei o texto!

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