sábado, 30 de dezembro de 2017

Porque eu virei professor (obrigado Wilton de Souza)






Acabei numa sala de aula por acaso. Estávamos em dezembro de 2001 e eu cobria uma pauta chata com algum ministro do governo FHC. Também no evento estava o querido fotógrafo Wilton de Souza, na época trabalhando no Jornal do Commercio. 

Já comentei aqui que uma das coisas que o jornalista mais faz na rua é esperar. Aquela pauta era uma delas e o Wilton aproveitou, se dirigiu a mim e perguntou: “Você já deu aula”? Levei um susto, nunca havia pensado na ideia. No entanto, assim que ouvi a pergunta, emendei: “Não, mas fiquei com vontade”. 

O diálogo prosseguiu; “minha mulher é coordenadora da Estácio e está procurando professor de rádio. Falei para ela que tinha alguém para indicar. Me passa seu numero”. Passei meu telefone, a mulher dele me ligou e fui contratado pela universidade. 

As aulas começaram em março, no mesmo mês aconteceu uma tragédia. Wilton chegava de uma pauta ao prédio do Jornal do Commercio. Bandidos em fuga saíram do túnel João Ricardo, entraram na Rua do Livramento pela contramão e atingiram o carro em que ele estava. 

Ele foi socorrido, mas não resistiu e morreu. O mais impressionante é que Wilton trabalhou em jornais onde cobriu tiroteios e manifestações. Como a vida é imprecisa, a tragédia lhe encontrou ao voltar de uma pauta para uma publicação que fazia pautas de gabinete. 

Falei com a viúva Margot e com o Wilton Jr., fotógrafo como o pai, a importância dele na minha vida. Aos 30 anos, o encontro com Wilton naquela pauta mudou o rumo da minha carreira. Ganhei uma segunda profissão por causa dele. 

E como foi bom começar a dar aula. Tive alunos muito legais naquela universidade. Nos seis anos seguintes foram muitas histórias que contei e aprendi. 

Vi nascer amores que já deram frutos: Thiago Teixeira & Lorena Cecília, André Lobão & Raquel Faillace, Leonardo Mululo Madela & Sânia Motta, por exemplo. Gente que continuo tendo contato por causa das redes sociais, como Flora Daemon, Djalma Oliveira, Rodrigo Mandarini, Thiago Lage, Márcio Ianacca, Cassius Leitão, Ana Claudia Rebello, Andre Luiz Borges e Heloisa Costa. 

Peço perdão aos que não citei. Não conseguiria falar todos os alunos da época da Estácio. Foram quase mil no tempo que fiquei lá. 

Tive a honra de ter colegas como Genilson Araújo, Nelson Moreira, André Balocco, Sandro Torres, Gutenberg Barbosa, Soraya Venegas e Élida Vaz, entre outros.

Na Estácio passei por uma saia justa engraçada. A escolha da figura de linguagem tem motivo. Entrei para dar aula no Campus Tom Jobim, na Barra. Dei a primeira aula, fazendo uma série de perguntas sobre atualidades e a turma acertando apenas algumas. No fim do encontro fui fazer a chamada. 

Enquanto dava a aula, identifiquei uma pessoa. No entanto, achei que na hora da chamada veria o nome e reconheceria. Ao acabar de ler a lista, fiz a tradicional pergunta se alguém não estava na pauta. A menina levantou a mão. Eu perguntei o nome e ela respondeu: Tais Bianca Araújo... Sim, era a atriz de TV. 

Senti o riso preso da turma. O professor marrento, que sabia o nome do ministro da Pesca, fora incapaz de identificar a atriz famosa na sala de aula. 

Um mês depois, quando as relações com a turma estavam mais tranquilas, dei uma aula sobre a importância de reconhecer erros e de ser humilde. Aproveitando o gancho, pedi desculpas para Tais por não tê-la reconhecido na primeira aula. Nesse momento irrompeu uma gargalhada na turma. Os alunos revelaram que eu virara piada. Não da parte de Tais. Na hora em que pedi desculpas, ela foi gentil e disse que eu não tinha a menor obrigação de saber quem era ela. 

Rimos muito na hora e a vida seguiu. Ela é gente boa e engraçada. No ano seguinte encontrei-a num camarote na Marquês de Sapucaí. Ela estrela da novela, eu o repórter caçando entrevistados às 4 da manhã. Quando me viu foi só sorrisos e muito simpática entrou no ar com todo carinho. 

Torço muito por ela, assim como torço por todos os alunos que passaram por minha vida. Mesmo com ela, que seguiu uma carreira diferente, fico feliz de ter feito parte de um pedacinho da sua trajetória. Esse é o barato de ser professor, ser o ponto de convergência de tantas aventuras legais. 

Ser professor é reconhecer que na vida a gente tem muito mais a aprender do que a ensinar. 


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