quarta-feira, 8 de novembro de 2017

A irresponsabilidade das palavras







William Waack é a mais nova vítima da sociedade da vigilância. O conceito, como eu disse aqui, é do escritor americano Jonathan Crary. Bem, podemos recorrer também ao livro 1984, de George Orwell,  sobre o Grande Irmão que tudo via e tudo ouvia. O apresentador do Jornal da Globo, que a todo momento mostra ser um homem com notório saber sobre tudo, esqueceu-se da premissa básica de um estúdio: não se fala coisa que possa comprometer sua reputação.  Vazou um vídeo na internet em que o apresentador faz um comentário preconceituoso, ao reclamar de um homem que buzinava antes de uma entrada o vivo diretamente de Washington. Waack se voltou para o entrevistado e comentou: “coisa de preto”. (https://www.youtube.com/watch?v=orZtVPZAve0)

Experiente, Willian Waack deveria ter na cabeça o “Escândalo da Parabólica”. Nele, o então ministro da Fazenda Rubens Ricúpero conversava informalmente com o jornalista Carlos Monforte antes de uma entrevista nos estúdio da TV Globo em Brasília. Ministro do governo Itamar, Ricúpero mostrou o pragmatismo da propaganda governista: “o que é bom a gente fatura, o que é ruim, a gente esconde”. O escândalo forçou o ministro a pedir demissão. (https://www.youtube.com/watch?v=33yfJ7K83ck)

O apresentador do Jornal da Globo escorregou na mesma casca de banana que seu colega Boris Casoy. Na noite de réveillon de 2009 dois varredores desejaram feliz ano novo. Por uma falha técnica do Jornal da Band, um áudio inconveniente Casoy vazou: “Que merda, dois lixeiros desejando felicidades do alto das suas vassouras. O mais baixo na escala do trabalho". Boris, hoje na Rede TV, teve que indenizar o gari José Domingos de Melo em R$ 60 mil. (https://www.youtube.com/watch?v=uI-ALaP_8xU)

As atitudes de dois jornalistas experientes como Waack e Casoy denotam a distância que os chamados “punhos de renda” guardam do público que os assiste. Foram de profunda insensibilidade.  


Waack foi afastado pela TV Globo. Não defendo condenações sumárias, qualquer declaração precisa ser contextualizada e o jornalista precisa ser ouvido. No entanto, as imagens não deixam muita margem à dúvidas. Willian Waack já foi condenado no tribunal da sociedade da vigilância. Por mais que tente se explicar, ficou “mal na foto”.


A TV Globo, empregadora de Waack,  que promoveu o primeiro casal inter-racial da TV brasileira, (a saber Milton Gonçalves e Suzana Faini, na novela Irmãos Coragem, 1970) deve ser firme na solução desse caso.  Para piorar a situação do apresentador, o racismo está sendo tratado na novela O outro lado do paraíso. O personagem de Eliane Giardini está representando a face cruel do racismo em sua relação com a personagem de Erika Januza, chamando-a em todos os capítulos de “preta do quilombo”.

Os casos de assédio na indústria do entretenimento americana, em que as empresas  preferiram o prejuízo ao contato tóxico com os acusados, dão uma ideia do poder de condenação do tribunal da sociedade da vigilância.


Se a emissora foi relativamente branda na reação às acusações contra José Mayer, será cobrada mais fortemente sobre a postura inaceitável de um de seus principais apresentadores.


Para se ter uma ideia, profissionais do departamento de jornalismo do Grupo Globo não podem fazer anúncios, pois devem ter a isenção preservada. Imagine o estrago para a imagem da emissora uma declaração dessa vinda de um dos apresentadores mais importantes do jornalismo da casa. Aliás, o vazamento de tal imagem quase um ano depois tem uma cara de “fogo amigo”, mas aí é só ilação, não há informação.


5 comentários:

  1. Inacreditável duas vezes. A primeira, por ter sido tão descuidado. A segunda - e mais grave - por ter dito o que disse.

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  2. Pedro Ernesto Denardin, da Rádio Gaúcha/RBS, recentemente gravado num churrasco fazendo comentários depreciativos a um ex-jogador do Grêmio teve melhor sorte.
    Estranho episódio esse do William Waack, que oferece uma excelente oportunidade para afastar alguém que parece não gozar da simpatia de muita gente, exatamente quando alguns nomes mais jovens, e que eventualmente ocupam seu lugar em certos programas, aparecem em ascensão, num momento em que cargos e salários estão sendo questionados.

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