terça-feira, 21 de novembro de 2017

Ressaca submarina




Natal de 2000. Depois de alguns anos eu consegui estar no plantão de Natal. Para quem não sabe, vou explicar como é o esquema de trabalho nas redações no fim do ano.

A equipe é dividida. Uma parte trabalha na semana do Natal e outra na do Ano Novo. Por exemplo, esse ano a divisão vai ficar próxima disso: equipe A trabalha de 20 a 26 de dezembro e equipe B de 27 de dezembro a 2 de janeiro.

Depois de dois réveillons na conta, com direito a uma virada no Forte de Copacabana e pancada da Polícia do Exército, consegui a alforria de trabalhar no plantão de Natal. A preferência costuma ser assim: casados com filhos ou quem tem família em outras cidades preferem folgar no Natal. Os solteiros, aqueles que encaram o feriado como um campo de batalha para novas aventuras, preferem folgar no ano novo. Minha lógica era outra: melhor se matar de trabalhar para depois descansar. Deve ser herança daquele aprendizado cristão de alcançar o reino dos céus após o sacrifício.

O fato é que enchi a cara de 24 para 25 e cheguei meio bêbado na redação às 7 da manhã. Ao chegar, me deparei com Ermelinda Rita frenética, bem ao seu estilo, gritando: “o submarino afundou”. Nisso o chefe do plantão, o querido e assertivo Luciano Garrido gritou: “bora correr, garotão, o submarino afundou”.

Achei que aquele alvoroço fosse produto de algum delírio etílico. Daquele tipo em que os rostos das pessoas vão assumindo desenhos disformes e as vozes vão ficando mais graves. Tudo parecia rodar em câmera lenta.

Estava amedrontado, não sabia se deveria fazer a pergunta que me atormentava, mas fui em frente: “mas o submarino não afunda naturalmente”? Luciano Garrido com sua carinhosa impaciência foi direto: Não, p...! O submarino estava ancorado, os caras fizeram uma m... e a p... do submarino afundou”. Acho que eu não conseguiria explicar de forma mais brilhante e sucinta.

Foi exatamente isso, um submarino estava ancorado no cais do Primeiro Distrito Naval, pertinho da Praça Mauá. Dois caras de serviço fizeram uma bobagem e o submarino Tonelero afundou. O submarino foi construído em 1972 na Inglaterra e foi vendido para a Marinha Brasileira. Nos relatórios oficiais constava que uma série de falhas no sistema hidráulico provocou o afundamento quando ele estava ancorado no Arsenal da Marinha.

Segui para a porta da unidade da Marinha. Eram 7h45 do dia 25 de dezembro. Havia apenas um soldado na sentinela. Quem já precisou fazer reportagens em unidades militares sabe bem que transparência não é o forte das Forças Armadas.

Só que a Marinha não podia evitar uma coisa. As equipes jornalísticas foram para o Elevado da Perimetral e puderam reportar a operação para consertar a trapalhada náutica.

E a recuperação da minha ressaca se deu em cima da falecida perimetral, vendo os rebocadores da Marinha tentando resgatar o inutilizado Tonelero do fundo da Baía de Guanabara.

Há um aspecto que me inquieta até hoje. Meu primo Paulo Cesar Lisboa é submarinista. Sempre pergunto a ele como conseguiu trabalhar naquela caixa de metal, toda apertada e que, ainda por cima, afunda. Ele me disse que o silêncio embaixo d’água acalma. Bem, eu não consigo entrar no submarino ancorado no Museu da Marinha.

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