Carta para minha mãe

                                                       

Oi mãe, tudo bem? Ontem foi seu aniversário e me deu um aperto danado no peito de não conseguir ouvir sua voz. Queria contar umas novidades.

Sua neta, a Clara Maria está grande, foi a uma festa sozinha. Deixei na porta e passei para pegar. Tem gente  que diz que ela parece com a senhora.

Nossa, mamei até os 4 anos e apesar dessa intimidade, não consigo chamar a senhora de você. Mãe, acabo de perceber uma coisa, no momento que escrevo essa carta, faltando seis meses para fazer 47 anos, tenho a idade que a senhora tinha quando eu nasci. Nossa mãe, não consigo nem imaginar isso, na minha idade ter um bebê para cuidar.

Ah, mas a senhora era forte e corajosa.  Depois de vir para o “sul maravilha” viúva e com 7 filhos, arrumou mais um quando já era avó. Sei o que é empoderamento feminino há muito tempo.

Voltando a falar da Clara Maria, ela gosta de dançar como a senhora me contou que gostava quando era menina. Bem, ela é faladeira que nem a senhora. Neste sábado cantou parabéns pra vovó. Ela tem o cabelo quase tão preto quanto o meu era antes de começar a ficar branco.

O Pedro está do meu tamanho e tem a voz mais grossa do que a minha. Eu era mais bagunceiro, acho que dei mais trabalho para a senhora do que ele a mim. Ah, ele se perdeu na praia assim como eu. Lembro da bronca que eu levei naquele dia até hoje.

A Ana Cláudia rezou pela senhora ontem. Ela é aquela mulher que a senhora me disse que ela seria, amorosa, cúmplice e uma grande mãe. Sou cercado desde sempre de mulheres fortes e determinadas. Ainda bem, o que seria de mim sem vocês.

Mãe, nunca é demais lembrar: eu te amo. Nossa, falei diversas vezes isso. Eu tinha medo que a senhora esquecesse, ou quando a senhora partisse,  eu não tivesse dito o suficiente, então falava muito.

Mãe, se der, olha pra gente ai de cima. A Quitéria estava com saudade e foi correndo encontrar a senhora há 4 anos, mas a gente quer ficar aqui por mais tempo.

Perdoe-me pelas vezes que ainda desobedeço algumas orientações que a senhora me deu com as melhores intenções. Continuo deixando as coisas para última hora, essa carta por exemplo era pra ter saído ontem.  A vida é assim, a gente tenta ensinar os filhos com nossos erros, mas eles aprendem cometendo os deles.

Tenho saudade de comer aquele bolo de feijão com farinha amassado pelas suas mãos. A senhora não vai acreditar, estou comendo até rabada, só não consigo encarar bife de fígado, isso não mudou.

Mãe, acho que entendi aquela conversa que a senhora teve comigo quando tinha 71 anos. Se a senhora não se lembra, vou reavivar. É aquela em que a senhora disse: “me olho no espelho e ainda vejo aquela menina de 17 anos”. É mãe, apesar de todas as provas que o espelho e meu corpo tentam dar em contrário, ainda me vejo com 13, 14 anos no máximo.

Agora tem esse negócio de blog, algumas pessoas vão ler a carta, não é violação de correspondência, não fique envergonhada.  Estou escrevendo só para dizer mais uma vez que a amo muito e que sinto muita falta. Nos meus sonhos ainda deito a cabeça no seu colo  e adormeço com seu cafuné.

Beijos

Júnior