quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Os que se acham deuses (Madame Valois)




Em outra vida, quando estagiava como técnico em edificações, trabalhei numa obra em um condomínio em Jacarepaguá. O condomínio se chamava Passaredo e a empresa construía casas pré-moldadas de luxo.

A obra ficava na Estrada do Rio Grande, na Taquara. Foi a primeira vez que descobri que as distâncias são superlativas em Jacarepaguá.

O caminho era simples. Estudava no Cefet de manhã. De tarde me mandava para a empresa em Ramos. Duas vezes por semana, em vez da velha Rua João Romariz, eu ia para a obra na Rio Grande.

Eu pegava o 601 e ele dava a volta ao mundo mas me deixava em frente ao condomínio da obra. Ao voltar para casa em Botafogo pegava o 601, saltava no Grajaú e pegava o 435. Chegava em duas horas.

Passados mais de 25 anos, conheço alguém que mora na Estrada do Rio Grande, estuda na PUC e trabalha na Barra. Tenho o privilégio de atualmente precisar me deslocar apenas 4 quilômetros até o trabalho. Logo, estou afastado dessa rotina massacrante.

Caroline conta que até a “racionalização” das linhas de ônibus tinha algumas opções, mas agora todos os caminhos passam pelo BRT. “Eu odeio o BRT, Creso. Os ônibus são mal conservados, vão lotados, demoram a passar e me fizeram ganhar apenas 20 minutos”. Carol me conta que uma ida de casa à universidade pode demorar duas horas e meia.

Mas para ela, o problema é a rotina selvagem dentro do veículo. “Creso, me transformei, me tornei uma pessoa agressiva. Não se tem respeito. Às vezes não consigo respirar”.

Caroline tem 1,53 m, o que nessa disputa por espaço é uma desvantagem competitiva. As leis da física são subjugadas na hora do rush no BRT. Ao enunciado “dois corpos não ocupam o mesmo ligar no espaço”, a falta de educação e a ineficiência do serviço respondem com outra: “empurra que dá”.

A própria Caroline reconhece: “eu sou privilegiada, minha mãe de vez em quando me dá uma carona”. Estamos falando de uma pessoa que circula em áreas assistidas da cidade.

Não pude deixar de perceber a consciência da minha aluna, que apesar dos inúmeros infortúnios diários no transporte público pela cidade, tem a consciência de que tem gente que passa por problemas piores. Universitária, faltando ainda um semestre por cursar, Caroline parece saber em que mundo vive, diferentemente da ministra dos Direitos Humanos. Com um salário de 33 mil reais, Luislinda Valois disse que não poder somar o salário de ministra ao de desembargadora aposentada a deixa em condições que se assemelham ao trabalho escravo. Por causa do teto do pagamento do servidor, limitado a 33 mil, ela não pode somar aos vencimentos a remuneração integral de ministra de estado. Recebendo por estar na pasta cerca de 3 mil reais.

Minha cara ministra, a senhora conhece as leis muito melhor do que eu. Ao aceitar o convite sabia que eram essas as condições. É um escárnio no país de 13 milhões de desempregados, com o salário mínimo de 937 reais a senhora fazer esse tipo de pleito. Maria Antonieta ressuscitou e mandou distribuir brioches nas filas de emprego Brasil afora.

Esse governo absurdo, com índice de popularidade subterrâneo,  comete um grande erro se mantiver a ministra.

Ministra, a senhora deveria dar uma volta no BRT com a Caroline. Quem sabe recobraria a consciência do país em que vive. O que mais me choca é a excelentíssima Madame Valois ter sido desembargadora.

Se arrepender agora, parece apenas um recuo para não ficar “mal na fita”. No entanto, acho que é tarde.

Bem, aprendi com uma pessoa querida a piada que ronda as cortes. O juiz se acha Deus, os desembargadores têm certeza. E ministro do Supremo? Manda soltar o diabo...

3 comentários:

  1. Indignado com na atitude dessa senhora. Pensando bem é cômico, mas trágico. Nosso pais é assim. Nao veremos mudanças ... talvez bisnetos... Ruy

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  2. Com certeza absoluta!"Madama" Valois só recuou pq ficou na mídia estampada ou melhor chapada,fotograficamente falando, nas telinhas e telonas das tvs, essas mesmas q o governo faz questão q tds tenham o sinal digital pra continuarem propagando seus funestos pensamentos em "cadeia" nacional! Direitos humanos para humanos direitos!

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  3. Excelente! Estamos vivendo um sarcasmo trágico!

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