segunda-feira, 14 de maio de 2018

O Outro Lado do Paraíso foi das piores novelas dos últimos tempos da TV Globo

Perdão se esse texto parecer atrasado, mas não pude escrever no dia que a novela acabou. Como a nova trama das 21h da TV Globo sempre demora um pouco a pegar, ainda vou falar de O Outro Lado do Paraíso. 

A novela foi uma das piores dos últimos anos. Acho que foi até pior do que Salve Jorge, outra obra sem pé nem cabeça que a Globo exibiu em horário nobre. Diferentemente da novela de Glória Pérez, O Outro Lado do Paraíso alcançou grandes índices de audiência. 

Fez isso com uma trama rasteira, de diálogos que para se tornarem paupérrimos deveriam melhorar muito. 

Walcyr Carrasco estraçalhou a discussão das novas famílias ao fazer comédia pastelão no núcleo do casal gay. Recorrendo a um artifício de Amor à Vida, usou a comédia para regenerar o Samuel de Eriberto Leão, a exemplo do que fez com o Felix, de Matheus Solano. 

O desenlace dos personagens de Cido e Samuel foi até sensível, mas desesperadoramente piegas. Ana Lúcia Torre usou o imenso talento para dar o mínimo de dignidade a uma caricatura preparada por Walcyr Carrasco para ela. 

O casal Clara-Patrick pode entrar no rol dos mais sem química das novelas. A cena de amor entre os dois teve zero de sensualidade. Foi quase constrangedora. A culpa é toda do autor, que construiu com Patrick um herói romântico despido de sensualidade. O figurino e as falas de Patrick não tinham ambiguidade, nem nuances. Ele era um personagem “flat”, irreal, perfeito demais. 

Do meio para o fim, Walcyr Carrasco reabilitou Gael. Sérgio Guizé também conseguiu se virar. A cena dele confessando ser um agressor de mulheres durante o julgamento da mãe foi mais rasa que piscina infantil de clube. 

Os diretores, tentando conferir alguma profundidade, deram close no rosto de todas as mulheres que assistiam a confissão no plenário. Empobrecedor, depois de uma novela tão impactante na questão feminina como foi a antecessora A Força do Querer. 

O último capítulo deixou uma barriga de continuidade impressionante. Depois de tudo que Renato representou, seu desfecho foi no mínimo ridículo. Ele levou um tiro e mais nada. Sumiu. Como sumiu a coerência de Walcyr Carrasco em várias passagens da trama. 

Laura Cardoso dançando ao som de Pablo Vittar foi um dos raros momentos de beleza no último capítulo. Mais pelo vigor da atriz do que pela excelência da cena. 

Fico imaginando o que pensam Lima Duarte e Fernanda Montenegro que já participaram de momentos tão significativos da TV, tendo que pronunciar textos tão pobres e viver personagens quase caricatos. 

O desfecho de Sofia foi uma das coisas mais perniciosas que a novela apresentou. A começar pela pobre Marieta Severo que graças aos caprichos do autor, teve que transformar sua vilã contemporânea, numa versão “Bruxa Memeia” de contos de fadas infantis. Boca torta, bengala e anel. Não faz sentido, Sofia é daquelas vilãs empertigadas, colocá-la com a saúde frágil foi de uma pobreza narrativa de fazer as geniais Janete Clair e Ivani Ribeiro revirarem nos túmulos. 

Mas o pior foi o simbolismo de Sofia ir para o manicômio tomar eletro-choque. Nesse nosso mundo de intolerância, em que a eliminação de quem pensa diferente está na ordem do dia, armar um subterfúgio para colocá-la no hospício como Clara fez é vil. Além do que, a prática do eletro-choque é não só questionável, como condenável. O autor nem precisaria ir muito longe para evitar seu arroubos totalitários. Glória Pires, mais uma de suas “vítimas”, interpretou no cinema Nise da Silveira, alguém que pregava uma forma diferente para o tratamento de pessoas com distúrbio mental. Bola muito fora de Walcyr Carrasco. 

O autor resolveu fazer ainda uma piada com os críticos. Um dos médicos que assinam o laudo que atesta a loucura de Sofia se chama Alessandro Dumas, numa alusão à Alexandre Dumas, autor de O Conde de Monte Cristo, obra na qual Walcyr Carrasco bebeu mais do que o recomendável para fazer a novela. 

A penúltima cena, aquela em que Clara, Patrick e Thomáz estão no Jalapão olhando o Horizonte, é praticamente igual à cena que encerra o filme o Conde de Monte Cristo, protagonizado por Jim Caviezel em 2002. 

Em resumo, O Outro Lado do Paraíso  foi um desserviço à dramaturgia e representou alguns passos atrás do que A Força do Querer conseguiu alcançar. No entanto, devem estar todos felizes na emissora. A novela teve ótima audiência, a tal ponto, que o Globoplay vai exibir em 10 episódios as vinganças de Clara. E mais uma vez veremos prevalecer a ideia de que os fins justificam os meios.  


3 comentários:

  1. Rapaz, vc tá escrevendo muito bem sobre novela! Não é um Nelson Rubens graças a Deus.
    O melhor da novela pra mim foi o figurino. Clara e suas camisetas cavadas, patrick de terno, Renato de blusa de malha e camisa de pano, o portugues sempre de camisa de tecido com o botão aberto...e vai por aí. Mais o melhor é que eu quero saber qual o banco que a Sofia usa, o APP dela é muito bom e a internet lá em Pedra Santa é muito boa. Ela cosegue fazer transferencia bancaria de mais de 10000,00 em 20 segundos.

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  2. Flávio,
    Muito bom!👏👏👏
    Você e o Creso se completam!
    Adorei!
    Bjs

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  3. O Walcyr Carrasco deveria ler esse texto com urgência! Quem sabe assim, ele toma a sábia decisão de se aposentar? Você disse tudo e mais um pouco, Creso!

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