terça-feira, 24 de outubro de 2017

Bola de segurança






Todo mundo precisa de uma bola de segurança. O conceito é importado do vôlei. Para quem não é afeito ao esporte, vou explicar. É aquele atacante que quando as coisas estão apertadas, o levantador aciona para que o time faça o ponto. Essa bola de segurança vai mudando ao longo da vida, nos diferentes campos em que o jogo se desenvolve. Por exemplo, em família. Talvez a primeira bola de segurança da vida seja a mãe. O primeiro lance, óbvio, é que sem o alimento que sai dela você não sobreviveria. Mas há muitos outros. Lembro sempre de uma vez que quiseram levar minha bicicleta na frente de casa. Fiz o que do alto dos meus 13 anos achei o mais sensato: agarrei-me à bicicleta e chamei minha mãe. Ela, com o seu 1,47 m, saiu de casa “armada” com uma vassoura e colocou o assaltante pra correr. Essa bola de segurança perdi há 16 anos, mas ainda sinto falta...

Outra bola de segurança é o irmão mais velho. Teve uma vez que me meti numa encrenca idiota. Um cara achou que eu estava olhando para a namorada de um amigo dele (eu não estava!). O cidadão era o protótipo do playboyzinho lutador. Surra na certa. No entanto, meu irmão, professor de luta-livre e músico, se apresentava no local. Num momento que fui ao banheiro, o cara me interpelou. Meu amigo Marcio, um desses irmãos que a vida dá pra gente,  sentiu que a barra pesara e avisou meu irmão de sangue. No momento que poderia ser o de um soco de consequências graves para o futuro dos meus dentes, meu irmão entra no banheiro e pergunta: “Está tudo bem, Junior”? E eu completo: “Tudo certo, irmão”. E completo olhando para o outro cara: “Ele é meu irmão”. Bem essa bola de segurança me rendeu um chopp de graça pago pelo meu quase agressor.

Uma vez reprovei uma aluna. No período seguinte ela fez a matéria comigo e passou. No fim do curso a turma teve a insensatez de me homenagear. A moça, que realmente eu não tinha nada contra, me apresentou à família. E disse: ”Foi ele que me reprovou. foi na primeira turma que ele deu aula. Na segunda vez, ele já tinha aprendido mais um pouquinho e aí, eu passei”. De bate-pronto minha mulher respondeu: “E você estudou mais um pouquinho”. Case-se com alguém que você possa ser e ter a bola de segurança.

O conceito de bola de segurança pode ser transposto também para o cinema. A gente pode destacar parcerias clássicas como as de Alfred Hitchcock e James Stewart, Martin Scorcese e Robert De Niro, Fellini e Marcello Mastroianni. Na TV, Janete Clair tinha em Francisco Cuoco e Dina Sfat as bolas de segurança dela. Gilberto Braga tem Malu Mader e Glória Pires, por exemplo.

Walcyr Carrasco na nova novela usa mão de duas bolas de segurança. Sergio Guizé, de Êta mundo bom, e Marieta Severo, de Verdades secretas. As bolas de segurança na dramaturgia servem para você direcionar as histórias quando as mesmas parecem emperrar. São aqueles personagens que muitas vezes o autor coloca na boca as palavras que queria dizer.

Na sua vida profissional você também tem e é bola de segurança. No entanto, ser uma bola de segurança requer uma visão que às vezes você não está preparado. Em muitas oportunidades, a bola de segurança se ressente porque a “jogada” só vai em sua direção quando há problemas. Em contrapartida, quem aciona a bola de segurança deve ter a sensibilidade de usá-la em outras situações que não as de resolução de encrencas. Caso contrário a jogada fica marcada e o ponto não vem.


Pensei em bola de segurança porque me lembrei muito da Elis Regina. “Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar”. Acho que aprender o jogo seja o mais difícil da vida, aliás, é um aprendizado em progresso, sempre incompleto.

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