segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Bonezinho, bermuda e all star




Entro no banco que tenho conta na zona Sul do Rio. Sentado no lobby vejo um homem de barba teclando alguma mensagem em  seu smartphone. Bonezinho, bermuda, all star. O personagem em questão tem inúmeros serviços prestados à música brasileira. 

A faxineira passa por ele, ele a chama pelo nome. Ela responde, “oi seu João”. Ele continua a teclar. Levava uma pasta sanfonada vermelha, que devia trazer as contas que fora pagar no banco. 

Eu tento observá-lo discretamente. Depois de tantos anos acompanhando pessoas renomadas em diversas áreas, algumas presenças ainda despertam aquela curiosidade de fã. E com seu João, ou melhor, João Bosco é assim. O cara sentado na minha frente tinha composto músicas que fazem parte da trilha sonora da minha vida.

Lembrei-me das aulas de dança de salão e da música Dois pra lá, dois pra cá. Sempre me vem à cabeça o cinismo de bijuteria: “minha pedra é ametista, minha cor o amarelo, mas sou sincero, necessito ir urgente ao dentista”, ou da crônica cotidiana presente em De frente pro crime: “Tá lá o corpo estendido no chão, em vez do rosto a foto de um gol”. Como a música e a voz do seu João casam perfeitamente com a pena genial de Aldir Blanc.

Acho que gostaria de ver João e Aldir no banco. Não tenho ideia de como seria o comportamento de Blanc numa agência bancária. O de João Bosco eu vi. Conhece os funcionários pelo nome. A moça do cafezinho, as recepcionistas e as gerentes.

Ele se levanta, cumprimenta todo mundo com um sorriso inesgotável e se encaminha para a saída. Espera abrir a primeira das duas portas automáticas. Ao passar por uma delas, o vigia que a gente não consegue ver o rosto brinca: "finalmente seu Mengão venceu  seu João", no que o artista responde: "pois é, e o teu Vasco"? "Venceu o Botafogo no Sábado", responde o vigilante. 

João saiu do banco e provavelmente deve estar dedilhando algo genial em casa. 

"Mas Creso, você foi abduzido pela síndrome de 'Caetano Veloso para o carro no Leblon', o que houve"?

Não, foi isso. Não estou querendo transformar esse espaço em um culto ao clique das celebridades. Apenas me impressionei com a simplicidade do João Bosco no banco, parece que toda complexidade de sua alma ele emprega para suingar o violão como poucos conseguem fazer. 

Recordei-me de uma entrevista que fiz com ele nos camarotes da Marques de Sapucaí. No comando da transmissão estava o saudoso Loureiro Neto. João Bosco me atendeu com toda a educação, e começou a falar com o Loureiro sobre uma edição do Papo de Botequim que ele havia ouvido. Uma edição com uma entrevista especial com Erasmo Carlos e como o bate-papo entre Loureiro e o Tremendão o emocionara. Um cara simples que ouvia rádio. 

Se vocês soubessem quanta gente marrenta eu já tive que encarar nos camarotes da vida.. Ainda bem que um dos grandes gênios da nossa música é tranquilo. 

Cada vez mais a vida deixa evidente que não existe fórmula de genialidade. Cada um consegue ser gênio ao seu jeito. Eu queria apenas dizer obrigado seu João, por ter composto O bêbado e a equilibrista, Dois pra lá, dois pra cá e tantos outros tesouros da nosso cancioneiro. 


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