domingo, 22 de outubro de 2017

Isso não é nome de gente, é de tranca de carro






Durante três anos na minha vida convivi no mundo musical. Estava sem grana, entrando na faculdade e precisando trabalhar. Minha grande amiga Bia Boechat cantava numa casa noturna que funcionava no Leblon e me indicou para lá. A casa se chamava People e abrigava shows de grandes nomes da MPB como, Nana Caymmi, Danilo Caymmi, MPB-4, Ângela Rô-Rô, Boca Livre, entre outros. A programação da casa era tocada pela dupla Elisa Ventura e Bebete Martins. Foi uma época de grana incerta, pouco sono, muita boemia e muitas, mas muitas histórias. Vou contar algumas ao longo da vida deste blog. Há casos que não posso tornar públicos, obviamente.

Adoro Tim Maia, quem não, né? Quase 20 anos após sua morte ainda não apareceu alguém que aliasse potência na voz, suingue e musicalidade como ele. Viveu escancaradamente seus excessos com comida, álcool, drogas e confusões. Quem quiser saber mais sobre Tim, tem em Vale Tudo, de Nelson Motta, leitura obrigatória.

Mas tenho com ele uma história acontecida uns 40 quilos atrás. Essa vida na produção musical me fez trabalhar a faculdade inteira. Os primeiros períodos foram tranquilos, pois as aulas eram de tarde. Meu fuso horário de ir dormir às 4, 5 horas da manhã era sob medida para a faculdade.
Eu tive problemas quando as aulas foram para o turno da manhã. Chegar à faculdade “virado” não era raro. Teve professor e matéria que eu simplesmente deletei da minha memória. Passei em todas as matérias, por incrível que possa parecer, mas em algumas disciplinas eu era apenas um corpo presente.

Diante deste relato, qual não foi a minha raiva, quando num dia que tinha oportunidade de dormir até mais tarde, minha mãe me acordou por causa de uma ligação.

Sonolento, atendi ao telefone. Uma voz estridente perguntou: “Por favor, o seu Crayson está?” Bem, já falei das confusões com o meu nome. Eu repespondi: “É Creso”. No que a mulher replicou: “Só um momento, que o seu Tim Maia vai falar”. Como já disse aqui, estou evitando palavrões neste espaço, mas apenas uma palavra de baixo calão para definir o sentimento que eu tinha pelo cidadão que me passava um trote naquele momento.

Enquanto tentava fazer um mapeamento mental de quem seria o autor da gracinha, uma segunda pessoa falou ao telefone. Agora era um homem: “Por favor, o seu Créuzon está?” Impacientemente respondi de novo; “É Creso.” E o segundo homem avisa: “Peraí, que o seu Tim Maia vai falar.”

Masoquista e curioso, esperei para ver onde aquele bullyng  telefônico iria parar. Foi quando aquela voz grave, inconfundivelmente carioca e cheia de maneirismos irrompeu no telefone: “Alooou, é o Creso?” Amigos, era o cara, o rei do soul brasileiro, me acordando, com aquela voz tonitruante do outro lado da linha. Respondi: “Sim, é ele.” Então Tim Maia começou a me explicar o motivo do insólito contato telefônico.

“É o seguinte: tô afim de mandar um levado para a Ângela Rô-Rô pagar um advogado”. Nota de esclarecimento: no dia anterior a Ângela tinha se envolvido em uma confusão com um oficial de justiça por não ter aceitado uma intimação. Ela tinha feito uns comentários sobre a Xuxa e a Marlene Mattos e estava sendo processada e o Tim queria pagar um advogado para ela.  Retomando o papo com o Tim: “Pôxa, Tim, não estou mais trabalhando com a Ângela, mas pode deixar que eu dou o recado a ela. Mas como você chegou ao meu nome?” Ele respondeu: “Teu nome tava na gravadora, aí eu entrei em contato, tu dá o recado pra ela?”. “Claro” respondi. E para arrematar o golpe final: “Mas vem cá, teu nome é Creso mesmo? Isso não é nome de gente é de tranca de carro, CresoLock”. E encerrou a ligação com uma gargalhada inconfundível. Aproximadamente três anos depois passou mal quando começava a fazer um show no Teatro Municipal de Niterói. Morreu poucos dias depois.

Já fui a muitos shows de artistas consagrados da MPB, mas nunca assisti ao Tim Maia. Meu contato com ele foi numa ligação telefônica em que ele se mostrou inteiramente “Tim Maia”. Solidário, ao querer dar dinheiro à irmã de alma. Errático, ao colocar dois assistentes para falar com uma pessoa que talvez o fizesse chegar à Ângela. E finalmente, irreverente, ao fazer a piada com o nome “exótico” de um interlocutor com quem tinha contato pela primeira vez.


Lendo a biografia dele escrita pelo Nelson Motta vi que fui incluído no rol das “vítimas” das ligações do cantor. Depois de passar as noites virado após um coquetel de TUDO que a gente possa imaginar, ele ligava aleatoriamente para s pessoas. Bem, para mim foi uma honra receber uma destas ligações. Meu caso não estava no livro, mas se O Nelson Motta conhecesse a história, provavelmente estaria. Claro, pelo nome da Ângela estar envolvido, não por minha causa.

Num texto próximo, conto outra das minhas aventuras no mundo musical.

3 comentários:

  1. Interessante mesmo. Típico do Tim Maia. Eu tive duas dessas. Uma com Filberto Gil, em 1987, na Eoquette Pinto, na campanha do Darcy Ribeiro, ao governo do Rio. Ele ligou pra emissora e eu atendi. Quando se identificou, eu falei: tá de sacanagem comigo né Silvio? ( Silvio Barsetti) . E ele/ que Silvio! É o Gil. Com a minha insistência, ele começou a cantar... aí eu falei : cara...não preciso completar! Ele queria participar no ar. A Roquette ocupava o terceiro lugar na audiência da época. Depois que ele saiu do ar, ligou de novo e pediu para me chamar. Ele disse: esse Silvio canta igual a mim? Sabe minhas músicas? E eu: sabe imitar todo mundo, mas não sei se canta. E ele: bom saber disso! Obrigado por franquiar minha participação na programação. E eu: desculpas e obrigado por me tratar com carinho. Ele: somos Darcy. Bj!

    A outra foi Lobão. Me liga ao saber que eu produzia, na TV Manchete, uma matéria sobre "Os ídolos do Rock in Roll que morreram de overdose". Ele falou: Renato, é o João Luís! E eu: que João Luis? Ele: carvalho (me desculpe o termo), você liga pra minha casa, fala com minha mulher, Regina, me acorda e pergunta que é João Luís? E eu: ah, sim. Lobão! Ele: me chame de João Luís. Eu disse: João não é para quem é íntimo seu? Ele: agora você e. Ninguém liga pra minha casa e minha mulher trata bem e diz que ligou pra mim um cara muito educado! Eu: pô, valeu! Ele: então, vc quer gravar comigo? Sim, se a pauta não te deixar desconfortável. Ele: meu amigo, faço da minha vida o que quero e nenhum fdp tem a ver com isso. Vem aqui no prédio. Avenida Nossa Senhora de Copacabana.....

    Eu falei: legal. Gostei de vc. Ele: eu também se não nem ficaria com vc no telefone. Me faz um favor? Eu : sim, claro. Ele: ensine os jornalistas a habilidade de conseguirem o que vc acaba de conseguir essas entrevistas. Eu: que nada! Não tenho nada pra ensinar. Aí ele: tem sim, porque vc é o primeiro repórter que não mando tomar no ....

    Eu disse: amigo esquece isso e vamos a entrevista antes que vc mude de ideia e me mande tomar no .....

    Ele: porra, Bem que a Degina disse que vc era f...

    Eu, sem Graça, passei a gostar desse artista com todos os defeitos dele, que, aliás, não me (nos) cabe julgar!!!

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  2. Fui "Roadie" e Segurança do Tim Maia por acaso, em 1992, quando eu participava em um Festival de Música em Cascavel, solicitado por dois músicos dele que tocavam comigo esporadicamente, Nabuco e Paulinho Black. o Roadie não foi com eles e fui contratado inclusive passei o som antes do Show, avisando o técnico de som para botar retorno no máximo, os organizadores do Festival me agradeceram muito pois, o Tim fêz 3 horas e meia de som e só um momento pediu para aumentar o retorno rs.

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