quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Os pais e o dilema de abrir a porta da gaiola




Deve ser dureza ser o filho mais velho. Como sou caçula e temporão, nem sei explicar este lado da moeda. Vivo numa casa em que há três caçulas e um primogênito. Eu, minha mulher e minha filha somos os mais novos. Sobrou para o meu filho a dura realidade de ser o primeiro. 

Ouvi uma frase certa vez que ficou na minha mente. O melhor presente que se dá a um filho é um irmão. No entanto, por diversos motivos, às vezes este presente não é possível. Mas entendo a frase. Trata-se de alguém para dividir as pressões que os país colocam nos filhos. 

Depositamos em nossos filhos todas as esperanças de que eles não cometam nossos erros na idade deles. No mais velho, então, a carga é maior. Costumamos até ser condescendentes com o caçula, pois somos mais experientes e vamos aprendendo com erros que cometemos com o mais velho. 

O primogênito sofre com pais de primeira viagem, que confundem os ossos humanos com frágeis cristais. Um espirro a 20 metros se transforma numa potencial contaminação por vírus um raro. 

O primeiro filho é o primeiro falar, logo, é o primeiro a reclamar, primeiro a levar bronca, o primeiro a ter responsabilidades, o primeiro a encarar a selva impiedosa que é uma escola. 

Meu primogênito começou uma nova fase. Deixou o Ensino Fundamental II, que na minha época se chamava ginásio. Trocou o uniforme azul que usava, por uma camisa bege. 

Agora, ele vai começar a descobrir que a luta é dele. Essa percepção virá em coisas prosaicas. Um exemplo: não poderei ajudá-lo com matemática, física e biologia. Ele vai ter que se virar. Nas matérias de humanas, ainda posso tentar. 

Ir e voltar sozinho da escola, ele já faz há um ano. No começo, eu fiquei com medo. Hoje, estimulo. 

O problema para o primeiro filho é que ele acaba sendo a cobaia para os experimentos da paternidade. O caçula aproveita o caminho e vai conseguindo seu espaço espelhado no que o mais velho vai fazendo. 

Um dos grandes desafios da paternidade é não sufocar o filho. Não querer viver suas dores, seus amigos, seus amores e desamores. 

Eles nos dão vários sinais que querem liberdade. O primeiro ao engatinhar, fase em que a independência é embrionária, passa pelo começar a andar e por aí vai. 

Pensei na primeira vez que meu filho andou sozinho de elevador. Foram nove andares de choro entre eu despachá-lo no nosso andar e a mãe pegá-lo no térreo. Andar de elevador sozinho é um dos primeiros atos de autonomia. 

Depois começam as idas à padaria, o tempo passa e gente deixa na porta do cinema e busca quando o filme acaba. Surge a fase em que a bicicleta se transforma num meio de ganhar o mundo, encurta distâncias e facilita a liberdade. 

E nós, os pais, como ficamos? Pedindo migalhas de atenção. Clamando para que todos os passos sejam devidamente avisados. Há sempre a preocupação com a segurança, nenhuma grande cidade é amigável, sofrendo ou não intervenção federal. 

Mas sejamos honestos, a busca pelo monitoramento tem 50% de medo da violência, mas a outra metade é um medo de abrir a porta da gaiola. O passarinho pode descobrir as vantagens de sair e se recusar a entrar novamente, ou pelo menos, diminuir o tempo no cativeiro. 

O fato é que meu filho mais velho foi para o Ensino Médio. Agora, mais do que em qualquer fase da vida dele até aqui, a bola está com ele. Eu posso me revezar nos papeis de torcedor e de treinador. Mas fazer gol, ganhar e perder os jogos depende cada vez mais dele do que de mim. 

Boa sorte, filho, faz da sua vida o seu reino. Encontre seus caminhos, mantenha o celular ligado. A gente vai estar por aqui, para ajudar no que puder e no que você deixar. 

Um comentário:

  1. Adorei tudo! Já vivi isto tudo! Sinto saudades desta época. Vivendo outra fase , outros sentimentos! Isto é a vida! Isto é viver!!! Salve a vida! Eliane

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