quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Nem todo mundo nasceu para ser Neymar



O caso aconteceu bem perto de mim. Não vou dar nomes. Até porque, de nada adiantariam as particularidades do fato. Busco o sentido geral, aquele que fale mais da essência que do tópico. 

Um menino muito inteligente e inquieto teve um problema na escola. Apanhou de um outro, quatro anos mais velho. A mãe, moradora de uma comunidade, procurou a escola. Na instituição indicaram que ela procurasse uma psicóloga, para que o menino conversasse e recuperasse a vontade de ir às aulas, pois o episódio o deixara com medo. 

A psicóloga viu que o menino era realmente muito esperto. Interessou-se pela criança e aconselhou a mãe a procurar uma escola particular, que oferece bolsas para crianças como o filho dela. 

A mãe levou o menino na tal escola que o acolheu e o submeteu a uma prova. Tempos depois, a instituição entrou em contato com ela dizendo que o menino tinha ido bem. No entanto, outro menino nas mesmas condições se saiu melhor, mas que ela aguardasse o contato e que providenciasse o histórico e outros documentos do filho. 

A mãe então foi conversar com a escola de origem. A diretora da instituição deu todo o tipo de conselho contrário à mulher. Disse que a realidade no colégio particular era completamente diferente da que o menino tinha. Que aquilo poderia prejudicar na formação do garoto. Chegaram a dizer que ela poderia até perder o filho. 

A moça, muito humilde, se apavorou. Rezou para que a instituição “rica” não entrasse em contato, como de fato, não entrou. 

Ela disse que torceu para não acontecer. Para ela, o importante é que o menino estude no ritmo que puder e dentro da sua realidade. 

Na verdade, estranhei a atitude da escola de origem. Na minha humilde opinião, em vez de desencorajar, a escola de origem deveria orientar à mãe. Depois procurar a escola “rica” e trocar impressões sobre o menino. 

O menino tem menos de 10 anos, a não ser que algo excepcional reverta sua realidade econômica, ele jamais ingressaria na escola em questão. Pareceu-me miopia da escola pública colocar tantos obstáculos na cabeça dessa mãe. 

Nesse país de tantas desigualdades, a oportunidade que apareceu para essa criança é quase como um prêmio de loteria. Claro, o garoto iria ver os amigos ganhando presentes ou tendo bens matérias que ele jamais sonharia. A questão é que a entrada nessa escola poderia dar instrumentos para uma mobilidade social que nosso país inibe. 

A escola que se propõe a ter um programa de bolsa para crianças mais pobres tem, provavelmente, um programa de acolhimento, para que essa criança não seja excluída pelas outras. 

Fiquei pensando que a escola de origem prestou um desserviço à formação do menino. Ele poderia mudar sua realidade tendo acesso a uma escola de ponta. 

Um pensamento mais utópico e profundo também me passou pela cabeça. Que um dia a escola pública seja minimamente capaz de dar aos alunos instrumentos para que eles construam caminhos que os tirem das condições de precariedade social. 

Estamos muito distantes disso, infelizmente. Fico pensando na minha trajetória escolar. De todos os anos do ensino de primeiro grau e segundo, só estudei em escola paga por dois anos. Se não tivesse feito uma universidade pública, provavelmente não arcar com os custos de uma particular. Sei que sou exceção numa estatística cruel de um país que não tinha política de cotas. 


Nesse país de estruturas rígidas, quando do se fala em mobilidade social, só o ensino de qualidade e acessível poderia diminuir o problema. Bem, a outra opção é você jogar bem futebol; No entanto, nem todos nasceram para ser Neymar.

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