sábado, 13 de janeiro de 2018

O mototaxista que salvou meu emprego



A PUC entrou na minha vida quase por acaso. Eu estava de férias no verão de 2006. Toca o telefone e do outro lado da linha a diretora da CBN na época, Mariza Tavares, me pergunta: “você gostaria de aula na PUC”?

Já estava em sala de aula há 4 anos. Respondi que sim imediatamente. A PUC estava mudando o currículo e teria mais aulas de rádio. Mariza foi procurada e me indicou. Aquela frente de trabalho veio a calhar. Minha filha mais nova estava com dois meses. O reforço no caixa era essencial.

Reuni-me com o então diretor da Faculdade de Comunicação, César Romero, ele me apresentou o currículo e me deu uma notícia preocupante. As aulas seriam terça e quinta das 13h às 19h. 

Você deve estar perguntando o motivo da notícia ser preocupante. Eu respondo. Dava aula na Estácio das 19h às 23h. A menos que eu desenvolvesse o dom da ubiquidade, aquela missão tinha tudo para dar errado. 

Ao iniciar o semestre na PUC, combinei com a turma das 17h, que a aula começaria pontualmente e que eu sairia as 18h40. Então minha rotina as quintas-feiras seria assim: 6h às 12h40 - CBN; 13h às 18h40m - PUC; 19h às 23h - Estácio de Sá. 

No papel, tudo uma beleza. O problema era colocar em prática essa agenda no trânsito do Rio de Janeiro. Eu trabalhava 17 horas naquelas quintas-feiras. Meu intervalo era somente durante o deslocamento. 

Empolgado, pego um táxi às 18h40m para estar no campus Rio Comprido às 19h. Cheguei às 19h25m. Fracasso na primeira tentativa. 

Fiquei uma semana pensando em como resolver o impasse. Cheguei a conclusão que o taxista não se emprenharia loucamente no trânsito para que eu chegasse ao meu destino na hora. Iria com meu carro. Chegamos à quinta-feira. Às 18h40m dei partida no possante. Agora sim, eu, esse Ayrton Senna redivivo, chegaria na hora. Minhas ilusões acabaram na Praça Sibelius, na Gávea. Cheguei à Estácio às 19h40m, ou seja, uma hora depois da partida. 

Na manhã seguinte, liguei para meu guru de trânsito na cidade, o amigo Genilson Araujo. Contei a ele minha agenda kamikaze e perguntei como fazer. Poderia haver alguma rota que eu não pensara ou alguma coisa que me salvasse, sei lá, um helicóptero. 

Genilson então me perguntou: “você pilota moto?” Não, eu não pilotava moto. Então o repórter aéreo me deu a dica: ‘Vai de mototáxi’. 

Assustei-me. No entanto, ele insistiu: ”quando você estiver saindo da Estácio, veja com algum daqueles mototaxistas que ficam na porta se eles podem fazer o serviço”. 

Segui o conselho. Abordei um dos mototaxistas e propus o acordo. Pagaria R$ 12 pela viagem. Genilson reclamou. Disse que “inflacionei” o mercado. 

Na quinta-feira seguinte, o mototaxista estava lá pontualmente. Coloquei o capacete, do qual não faço ideia da procedência ou das cabeças já habitara, e segui viagem. 

Uma beleza! Cheguei em 19 minutos. Meu problema de agenda estava resolvido.  Contando hoje, 12 anos depois, foi fácil. Mas gostaria de expor alguns detalhes das viagens. 

O mototaxista pilotava pelo “corredor”, aquela faixa inventada pelos motociclistas para driblar os engarrafamentos. Passar entre os carros quando não se está habituado desperta pânico. Apertei tanto minhas pernas que fiquei com medo do piloto se apaixonar por mim. Além disso, eu precisava de uns 15 minutos para voltar à “rotação” normal, já que a proximidade de retrovisores, ônibus e para-choques tinha o efeito de uma dose de ritalina em meu organismo. 

O engraçado: nunca soube o nome do rapaz que me buscava e ele nunca soube o meu. Eu o chamava de piloto e ele a mim de professor. Depois fiquei pensando que isso era perigoso. Se o celular dele fosse grampeado, eu teria dificuldades de me explicar. Era capaz de a polícia suspeitar de uma conexão Turano-Gávea. Aí eu me veria personagem de Tropa de Elite. 

Como sou um cidadão de sorte, o celular não foi grampeado e não choveu em nenhuma quinta-feira letiva no primeiro semestre de 2006. Se houvesse essa moda na época, eu postaria #tbt com uma foto na garupa do piloto. 

Se bem que não tenho tantas saudades assim. Quando eu saia de casa o vigia da noite do meu prédio ainda estava na portaria. Quando eu voltava, ele estava no posto de novo. Enquanto ele vivia, eu trabalhava correndo de um lado para o outro. Mas valeu a pena. Foi a porta de entrada da PUC na minha vida.

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