sexta-feira, 20 de abril de 2018

Você conhece a LDRV?

Uma menina precisava de uma revista que tinha um artigo para usar no seu trabalho de conclusão de curso, o famigerado TCC. O orientador, com quem ela não mantinha relação das mais cordiais, tinha a publicação, mas negava o empréstimo . Dizia que ela não era responsável e que a revista era rara. No entanto, depois de muita insistência, ele emprestou. A menina foi ao banheiro e esqueceu a revista. A moça da limpeza jogou fora. Sem saber o que fazer, ela postou a história numa página do Facebook chamada LDRV. Depois de milhares de curtidas e conselhos, uma pessoa arrumou para ela outro exemplar da revista. A moça pode devolver ao professor no prazo.

Na mesma página, um jovem pediu conselhos para uma crise grave. Era gay e não sabia como contar aos pais. E perguntava o que fazer. 

Se você tem menos de 35 anos e não é uma pessoa descolado, provavelmente não conhece a página. Então, eu, que nem sou tão descolado assim, vou explicar. A página LDRV significa Lana Del Rey Vevo. Por partes: Lana Del Rey é uma cantora americana que tem uma voz bonita e umas musicas que soam um pouco melancólicas. No entanto, faz a cabeça de uma galera e agrada muito a meninos e meninas gays. Não sei se é possível classificá-la como diva., vou até perguntar aos meus alunos fãs.Ah, Vevo é um portal de música e entretenimento. 

A LDRV tem um dialeto próprio e se pretende secreta, apesar de ter quase um milhão de pessoas inscritas na página. Provavelmente você já usou alguma palavra ou expressão nascida lá. Exemplos: Homão da Porra, para definir um homem bonito; ranço, para descrever uma sensação incômoda com alguém ou com alguma situação; flopar, para dizer que algo deu errado, ou ainda, isso ou alguém é um hino, para atestar a qualidade do objeto. 

Na LDRV há um vocabulário próprio para os processos internos. Quando uma história como a da revista viraliza, ela se transforma em uma “tour”. Se a história que deu início à “tour” é atualizada, o autor dá um “edit” para que a audiência fique por dentro do que está acontecendo. Aliás, a expressão “fique por dentro” é totalmente anti-LDRV. 

Os posts contam casos light, mas há revelações para vários tipos de gosta, com o mais variado nível de intimidade e explicitação. Não é tão fácil entrar na LDRV. Algum integrante tem que convidar. Depois o autor da página analisa o perfil do pretendente para ver se ele está apto a ter acesso aos posts. 

O fato que a LDRV é um daqueles casos que ficam fora do radar de uma faixa etária mais velha. É uma coisa de jovens, com jovens e para jovens. Sem o manual de instruções fica difícil para o quarentão, próximo de se tornar um cinquentão se achar. 

Só soube da existência da página porque sou um privilegiado. Convivo com jovens que integram à LDRV. O que me impressiona é isso passar ao largo do meu entendimento, é mais uma prova de que no mundo digital em que eles estão inseridos, as tribos encontram uma linguagem mais própria, distante de quem está fora do circuito. 

E não adianta você querer posar de descolado, pois é inútil. Uma das minhas alunas até me convidou para participar, mas acho que se fizerem uma análise minuciosa do meu perfil vão descobrir que eu não me encaixo. Até porque, para ser aceito, eu não devia ter revelado as histórias que estão lá. 

Este fenômeno comunicacional é um grande barato, mas é desafiador para quem precisa se adaptar. Códigos próprios e sistemas próprios sempre existiram. Juridiquês, economês e que tais são formas que as  categorias profissionais, por exemplo, encontraram para se se preservar e se identificar. O que caracteriza a LDRV é um corte mais transversal. Não é uma afinidade profissional, é um enquadramento sem enquadramento. Qualquer assunto pode virar post e post virar “tour”. Não há pauta tangível. Ê diferente de uma página política, religiosa ou musical. É tudo isso e nada disso. A linguagem é desabrida, revelações íntimas são jogadas num fórum de um milhão de pessoas. Isso mesmo, um milhão de pessoas.  

Os tempos mudaram e quando a gente esquece disso acaba por se surpreender. Para mim o impressionante é que a página tem quase dois anos e eu só fui conhecê-la essa semana. Então amigos, pensem no seguinte. Quem é mais novo tem muito a ensinar e se a gente não quiser aprender, vai ter dificuldade no futuro até para falar. 









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