sexta-feira, 27 de abril de 2018

A gente deveria gritar mais pelos motivos certos


Conversava com meu amigo e mestre Giovanni Faria sobre a vida. Aliás, conversar com Gio rende sempre boas histórias. Ele trabalhou 17 anos no Jornal O Globo e me contava que no momento do fechamento do jornal, o ritmo frenético provocava coisas inimagináveis: “uma vez um dos melhores redatores com quem trabalhei gritou: ‘mexer é com “x” ou com ch?’”

A pergunta não foi fruto de ignorância ou desinteligência, a questão é que submetidos a situações estressantes, as dúvidas que pareciam as mais elementares transformam-se num monstrengo. O grito do redator era um pedido de ajuda. 

Acho que todos nós temos que saber o momento certo de pedir ajuda. O orgulho, a insegurança ou medo de parecer imperfeitos tira-nos o recurso de pedir socorro. A dúvida do redator era relativamente fácil de ser resolvida. Mas há outras mais complexas e nos recusamos a tentar o auxílio de alguém mais experiente. 

Talvez o mundo esteja barulhento pelos motivos errados. O subir o tom de voz na hora de pedir auxílio deveria ser uma prática cotidiana. Mas a gente grita mais por ordens, divergências e ódios, não para pedir ajuda. 

Muitas vezes sentimos que os celulares, extensões de nossas mãos e de nossos cérebros, nos retirarão do “vale da sobra das dúvidas e das angústias”. No entanto, por mais memória e brilho que eles tenham, não devem substituir o olhar no olho e o toque das mãos em outras mãos. 

Da mesma forma que não gritamos para pedir ajuda, não falamos com os outros para demonstrar afeto. Chega-se ao ponto de pegar carona e não conversar com a pessoa do lado, coloca-se um fone no ouvido e deixa-se o que classicamente era definido como convívio fora das experiências cotidianas. 

Numa boa, a gente tem que gritar mais. Olhar mais nos olhos, ter mais dúvidas. Não se conformar com a distância das pessoas queridas. Quando os ambientes estiverem silenciosos, seja você o agente da desordem. Converse, puxe assunto. Ligue para seus amigos. Marque um chopp. É difícil, nossos tempos são opressores quando o assunto é agenda. A vida é mais do que a tela do celular. Claro, o conselho do barulho só não vale quando você estiver numa biblioteca.  

Barulhe-se sempre que possível!

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