sexta-feira, 23 de março de 2018

A guerra de narrativas do caso Marielle

A disputa das narrativas é algo que a humanidade faz desde sempre. Algumas são hegemônicas por um tempo, depois são ultrapassadas. Para os cristãos, por exemplo, a narrativa descrita no livro de Gênesis sobre a criação do mundo e a origem do homem dominou absoluta durante séculos o senso comum. 

O gênio do basquete atual, Kyrie Irving, por exemplo, é terraplanista, ou seja acredita que a terra é plana. Como o astro da NBA , milhões de pessoas ainda acreditam nisso, apesar de Aristoteles há cerca de 2500 anos ter fornecido evidências da forma esférica da terra. 

Se antes a luta a disputa pela narrativa era mais perene, hoje ela é veloz, imediata e em escala global. A batalha que se trava em torno de Marielle Franco é o exemplo mais significativo dos últimos tempos. 

A excelente reportagem de Marco Grillo e Gabriel Cariello no Globo mostra o caminho dos boatos sobre a morte de Marielle. O jornal descobriu um nome sem foto, Luciano Aylan, digitalmente falando, íntimo do Movimento Brasil Livre. A reportagem ainda aponta que apesar de alegar não conhecer Aylan, o MBL compartilha vários posts do perfil dele. 

Como já fiz esta semana, vou  citar o antropólogo francês Edgard Morin. No texto Inteligência Cega, Morin faz uma reflexão importante que pode ser usada neste caso.  Ele diz que o erro, a ignorância e a cegueira progridem ao mesmo tempo que nosso conhecimento. Segundo o antropólogo, a causa profunda do erro não está no próprio erro, ou no erro lógico (que ele chamou de incoerência), mas como organizamos ideologicamente nosso saber. 

Aylan, muito amigo do MBL, espalhou o boato, ou seja o erro, não por incoerência e sim por ideologia. Quem recebeu e espalhou, como a desembargadora Marília de Castro Neves, o fez também por causa da ideologia impregnada em suas ideias. 

O MBL tenta jogar com suas armas nesta disputa de narrativas. O MBL e Aylan, o amigo sem rosto do movimento, atacam o que Marielle representa: a luta por direitos humanos e inclusão social. 

Outro exemplo. Há uma narrativa em que se associa a morte de Marielle à necessidade da intervenção federal no Rio. Nesta narrativa, pouco se menciona o fato de que Marielle era contra a medida posta em prática pelo governo Temer. 

A verdade é que na esfera do mundo em que aperta-se a mão e olha-se no olho já faz mais de uma semana do crime e a polícia pouco progrediu para encontrar quem atirou em Marielle.

Que a morte dela legue mais do que sofrimento e dor. Que a luta dela frutifique, apesar do MBL, Luciano Aylan, Marília de Castro Neves, entre tantos outros. 

Um comentário: