domingo, 11 de março de 2018

O evangelho de nossos dias






Ser jornalista é quase ingrato. Se a gente olhar muito de perto, perde a noção da importância do que se faz. Fazer jornalismo é um eterno renovar da ideia que o todo é muito maior do que a soma das partes. É aquilo cantado por Beto Guedes: um mais um é sempre mais que dois. 

A importância do jornalismo só se percebe com o olhar em perspectiva. Se você colar os olhos num quadro não vai perceber a técnica do artista, apenas a pincelada unitária. E aquela borrada na tela é apenas uma pincelada. A reunião delas faz com que o quadro se defina. As pinceladas se ressignificam. Picasso usou milhares para pintar “Guernica”. 

Mas voltamos ao todo e não à parte. A devoção do jornalista faz com que sua matéria ganhe a dimensão épica. Pragmaticamente, sua obra perecerá aos primeiros raios da manhã, mesmo assim, ele continua a escrever. Escreve para manter o coração pulsando. 

Fazer jornalismo é fundamental para o agora e para o futuro. Daqui a 100 anos nossos tataranetos tomarão consciência desses loucos dias por intermédio do que venhamos a deixar registrado em nossas matérias. Elas estarão publicadas em plataformas existentes e nas que ainda serão inventadas. 

Em alguma encarnação passada escrevi, com boa dose de pretensão: o jornalista escreve o evangelho de nossos dias. A retórica tenta salvar a frase da mediocridade, mas o postulado é totalmente verdadeiro. 

Nossas atitudes nos precedem e superam. Logo, somos impelidos a ser responsáveis. Quais exemplos legaremos aos nossos ramos genealógicos?

Qual sentimento haverá por nossas fotos registradas em portfólios de megaterabites (acabo de inventar a medida)? Pode ser que no nascimento, nossos descendentes recebam um chip que lhes orientará os passos. Vá saber. 

Mas na base deste ultra programa avançado estarão nossas matérias. O jornalismo é imortal, sempre haverá a necessidade do mensageiro. 

Seremos atacados, muitos dirão que o jornalismo morreu. Visões fatalistas exibirão meteoros caindo e os jornalistas desaparecendo da face da terra, como dinossauros. Mas a técnica e o profissionalismo manterão a chama acesa. Na hora que a fome de informação apertar, os jornalistas serão os responsáveis por matá-la.

Vamos separar uma coisa da outra. O jornalismo não está em crise. Ele se faz cada vez mais necessário. As grandes redações é que estão em crise. A busca incessante pela colaboração de leitores, ouvintes e espectadores mostra mais a fraqueza do modelo de negócio dos grandes veículos do que  a falência do jornalismo.  

O jornalismo, esse eterno adolescente questionador, sobrevive em cada resposta perseguida, em cada mentira desmascarada e a cada vida resgatada do escuro. 

Se você quiser falar mal do jornalismo pense: ruim com ele, muito pior sem ele. 

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